O caso da estátua de Camilo a fazer figura de sugar daddy (é isto, não é?), que alguns quiseram retirar de uma praça do Porto e muitos mais quiseram manter, obriga-nos a pensar nas questões do poder, da competência e dos critérios de quem toma as decisões. Quem manda nas nossas praças, quem decide que mamarrachos lhes podem pôr em cima, e por quanto tempo temos de os aturar ali? E segundo que critérios? O Camilo é apenas o episódio mais recente deste conflito sobre o uso do espaço público. Mas lembro algumas estátuas relativamente recentes que pretendem retratar o homenageado e que mais parecem vingança ou chacota (desde o Ronaldo ao Zeca Afonso), lembro o trambolho de 300.000 euros de Pedro Cabrita Reis na marginal de Leça, a estátua desavergonhadamente racista e colonialista do Padre António Vieira a erguer uma cruz acima da cabeça de povos indígenas simbolizados por criancinhas, o desconchavado rabo em Coimbra, que pretende ser uma homenagem ao fado. Entre muitas outras peças que pululam pelas ruas e praças, coisinhas "engraçadas", "giras", ou, como lhes chama um amigo meu, "bibelots de rua". Para não falar nas rotundas, ai!, as rotundas de Portugal! Uma pessoa pensa no D. Sebastião do Cutileiro, em Lagos, ou na sua Deu-la-Deu Martins em Monção. Pensa na Tragédia do Mar, de José João Brito em Matosinhos e no Lince Ibérico de Bordalo II em Lisboa, e pergunta-se como é possível um povo que já foi capaz de enriquecer as suas cidades com esculturas tão cheias de modernidade, solidez conceptual e excelência de execução, estar a cair cada vez mais para tão confrangedora mediocridade. Não estou a propor que se tire das cidades toda essa tralha, esse kitsch, esses exercícios de artistas muito esforçados que ainda não repararam que já não estamos no século XIX. Só queria mesmo saber: quais são os critérios de quem decide?
Sem comentários:
Enviar um comentário