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04 maio 2020

anões aos ombros de gigantes

Em Setembro de 2018, em férias na Serra da Arrábida, uma verdade que sabia há muito encontrou finalmente as palavras certas para se afirmar em mim com toda a nitidez:

No nosso planeta, a extinção de espécies é um fenómeno quotidiano - e para a Natureza os seres humanos são apenas mais uma espécie. A Natureza subtrai e segue, impassível.

Perante a constatação, desenhou-se também com nitidez um sobressalto: sem nós, que vai ser do Goethe?

(Antes que se lembrem de me tirar a nacionalidade portuguesa, em meu favor argumento que Goethe é um gigante que ainda não consegui alcançar, e a sua conquista é um daqueles projectos que guardo para realizar quando for grande. Talvez por isso tenha sido o seu o primeiro nome a ocorrer-me ao tomar consciência da nossa transitoriedade como espécie.)

Em tempos de covid, a vulnerabilidade do homo sapiens é bastante palpável. Mas em 2018 o que realmente me assustava - e continua a assustar bem mais do que este vírus - é o que estamos a fazer ao planeta, e o preço que os nossos filhos vão pagar pela irresponsabilidade generalizada.

Ao longo dos séculos temos progredido como - para usar a famosa metáfora - anões sobre os ombros de gigantes. O inverso também é válido: os gigantes precisam dos nossos ombros para serem levados às gerações seguintes. Se cairmos, caem connosco.

O egoísmo e a cobiça dos privilegiados - indivíduos, grupos, países - que estão a conduzir o equilíbrio planetário para pontos de descarrilamento irreparável, constituem uma dupla traição: aos que vêm depois de nós, e vão receber das nossas mãos a herança de um planeta profundamente doente, e aos gigantes que nos trouxeram até aqui - esses que deram o seu melhor para oferecer aos vindouros um mundo mais justo, mais solidário, mais pacífico e mais humano.


28 abril 2020

reconquista



Há dias disse a uma amiga, que mora mesmo à frente de uma bela montanha dos Alpes, que para ela devia ser horroroso morar junto à montanha onde adora fazer caminhadas, e não poder afastar-se mais do que 1 km da sua casa.

Ela riu-se: "Mas os animais andam felicíssimos! Nunca se viu tanta bicharada por lá!"

Isso, e estas imagens, lembram-me o batido poema de Brecht: "do rio que tudo arrasta..."

O que não terão sofrido estes animais quotidianamente durante todos os anos em que os humanos andaram à solta?


28 fevereiro 2020

fase de aquecimento

E vocês: o corona vírus já vos estragou alguns planos?
No nosso caso:
- Perdemos uma reserva no nosso airbnb, porque cancelaram uma feira de moda asiática aqui em Berlim.
- Cancelaram um congresso ao qual o Joachim ia, em Taiwan, de modo que eu vou para a Bretanha já no próximo domingo, em vez de ir só depois do seu regresso da Ásia.
- Está a ficar cada vez mais difícil encontrar certos medicamentos, porque são produzidos na China.

Diz que a economia alemã vai passar mal, porque a China é um parceiro muito importante, mas essa parte ainda não se fez sentir directamente na minha vida. Já na vida dos trabalhadores da Lufthansa Cargo...

Fico a pensar: o capitalismo criou a globalização para optimizar processos (enfim, "optimizar" é como quem diz - o planeta, por exemplo, tem outra opinião) e depois vem uma gripezinha nova e começa a meter grãos de areia na engrenagem. 
Ah, por falar em doença nova: sabe-se lá que surpresas nos reserva o permafrost da Sibéria. Aquilo é uma espécie de congelador cheio de vida interior: bacilos de doenças que se julgavam extintas, por exemplo. É, como quem diz: era. A vida interior do permafrost siberiano já começou a partilhar-se generosamente com o nosso mundo. Por exemplo: vítimas mortais de antraz, por causa de um cadáver de rena vítima dessa doença, que estava ali bem guardado há séculos. Recomeçaram a vacinar as renas selvagens e os humanos contra uma doença que se julgava extinta. 
Dantes - quer dizer, antes do Trump, do Bolsonaro, do Höcke - eu pensava com perplexidade nos alemães dos anos 20 do século passado: como foi possível assistirem à ascensão do nazismo sem fazerem nada? Agora começo a perceber melhor. E um dia destes, temo, também me vou sentir bem mais próxima dos indígenas das Américas quando começaram a morrer de doenças que não conheciam.

Já agora, outra pergunta: também ouvem muitas vezes notícias sobre o custo de projectos em curso para reagir ao aquecimento climático? Tipo: quase mil milhões de euros para reflorestar a Alemanha, porque as árvores actuais estão a ser dizimadas por um insecto que se tem multiplicado exponencialmente devido à ausência de frio invernal nos últimos anos.

De cada vez que leio comentários dos bots a espalhar a ideia de que o aquecimento climático é uma invenção dos governos de esquerda para aumentarem os impostos com desculpas parvas penso nos custos de reflorestamento, de reforço dos diques holandeses, de vacinar as renas siberianas. E isto, a bem dizer, ainda nem começou a ser a sério. Que fará quando for.