23 setembro 2022

a nossa Rainha Santa Isabel, essa autêntica sereia negra

 


A Disney "ousou" escolher uma actriz negra para o papel de Pequena Sereia, e eis que se ouvem críticas à deturpação do original, porque, dizem, ninguém tem o direito de se apropriar da história de Hans-Christian Andersen. 

O que me fez pensar imediatamente na Santa Isabel da Turíngia, que era muito amiga dos pobres e transformou pão em rosas. Soa familiar, não é? Pois claro que soa: a nossa rainha Santa Isabel, que nasceu quarenta anos depois de a sua parenta ter morrido, resolveu apropriar-se da lenda. E assim se passa de uma personagem principal de pele "tão clara e delicada como uma pétala de rosa, e olhos tão azuis como um lago profundo" (sim, dei-me ao trabalho de ir ler o Andersen) para uma de feições mais trigueirinhas, mais adaptada às nossas latitudes.

A culpa deve ter sido do SOS Racismo da Idade Média...

E se pensam que os exemplos chocantes acabavam com esta flagrante histórica de roubar aos loiros para dar aos morenos, enganam-se: antes de ser roubado para melhor acomodar os interesses portugueses, o milagre das rosas já tinha sido roubado para ser atribuído a um homem, o São Nicolau de Tolentino.  

A culpa será, deixa cá ver... do lobby gay? dos fanáticos da ideologia de género? dos machistas, que não suportam ver uma mulher a fazer boa figura?

Em todo o caso: Isabel, rainha santa, devolve o que não é teu! Arranja para ti um milagre original, em vez de te pores a roubar o que é tradicionalmente dos outros. Que coisa tão feia, e que grande vergonha para Portugal!...

(Sim, eu sei que é normal as lendas passarem de uns santos para outros, e também sei que quem conta um conto acrescenta um ponto. Mas os fanáticos da branquitude da pequena sereia parece que não sabem. Só me pergunto se estariam a dormir quando a Disney transformou a sereia albina do Andersen numa beldade ruiva, juntou mais algumas peripécias e permitiu um final feliz, bem ao contrário do do conto original. Vai-se a ver, e a única coisa que realmente não pode mudar é a cor da pele?...)

(Para quem diz que "não havia necessidade": lembro-me bem do que senti quando - eu, que nasci branca num mundo de brancos e numa família relativamente privilegiada - vi a primeira boneca com cabelos e olhos castanhos como os meus. Até então, eram todas loiras de olhos azuis, e eu sentia que entre elas e eu havia uma "não pertença", e que era eu quem não pertencia: não estava à altura das minhas bonecas.)

  


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