21 novembro 2018

touradas

Lembro-me da primeira vez que vi uma tourada na televisão. Mesmo sendo a preto e branco, achei aquele espectáculo uma barbaridade. Os meus pais explicaram-me que o touro não sentia nada, que era pouco mais que uma injecção.

Tinha seis anos, eram os meus pais, quis acreditar. Acreditei. Durante décadas consegui fazer de conta que era só uma injecção.

Fui a duas touradas. Estava a fazer férias com amigos alemães, e lembrei-me de lhes mostrar "cultura portuguesa". Ainda queria acreditar que "era como uma injecção", e além disso era "cultura". Os amigos que levei à primeira das minhas touradas disfarçaram bem. Os que foram à segunda tourada não disfarçaram nada. E além disso um dos animais começou a mijar-se sem parar. Não sei se era de medo, se era de nervos, se era o quê. Sei que só então fui capaz de abrir realmente os olhos, ver o logro dos meus pais, dar-me conta do horror de tudo aquilo.

Ultimamente tenho lido vários textos sobre o sofrimento do touro. Agradeço a todos os que os escreveram. Que ninguém mais volte a conseguir acreditar que as bandarilhas não doem, e que as touradas não provocam um sofrimento terrível ao touro.


Este, que partilho a seguir, estava no blogue Pró Touro - pelos touros em liberdade.


Jose Sepúlveda, técnico de som do Canal Nou e que durante algum tempo trabalhou na transmissão de touradas decidiu relatar aquilo que viu e ouviu durante estas emissões. A imagem inserida no texto é apenas para ilustração do artigo.

” Sempre que trabalhei na parte sonora das transmissões frequentemente comentava que se em lugar da banda de música, dos aplausos, dos bravos, dos olés e etc o som fosse captado pelo Sennheiser 816 (microfone que capta a grande distância e com muita qualidade) perto da arena onde se escuta perfeitamente o som das bandarilhas a entrar na pele, os mugidos de dor do animal a cada tortura que é submetido e além disso se as pessoas acompanhassem os primeiros planos das feridas, dos coágulos tão grandes como a palma da mão, do sangue que jorra, do bater do coração ou o olhar do animal antes da estocada final 90% desligaria a televisão ao presenciar tamanha chacina ao ritmo de pasodoble.
Eu pessoalmente pedi para deixar de fazer esse tipo de trabalho, porque um dia em Castellón, tocou-me estar entre barreiras e fiquei muito incomodado ao escutar um touro depois do toureiro ter falhado por quatro vezes a estocada e tive que tirar os auscultadores e o animal agonizava, cuspia, afogava-se no seu sangue vindo morrer mesmo ao pé de mim apoiado na madeira e o seu olhar ensanguentado e com lágrimas, sim lágrimas, sejam ou não sejam de dor cruzou-se com o meu até que um inútil falhou duas vezes o descabelo e eu disse-lhe tudo e mais alguma coisa.

touro agonizando

Foi aí que terminou o meu trabalho em praças de touros para toda a vida.
São sentimentos pessoais e o mais provável é que um amante da “fiesta” ache ridículo, mas para mim ridículo é quando depois de semelhante carnificina olhas para o público e vês que aplaude, come sandes sem qualquer preocupação não tendo visto nem ouvido o que eu testemunhei”.


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