Tinha seis anos, eram os meus pais, quis acreditar. Acreditei. Durante décadas consegui fazer de conta que era só uma injecção.
Fui a duas touradas. Estava a fazer férias com amigos alemães, e lembrei-me de lhes mostrar "cultura portuguesa". Ainda queria acreditar que "era como uma injecção", e além disso era "cultura". Os amigos que levei à primeira das minhas touradas disfarçaram bem. Os que foram à segunda tourada não disfarçaram nada. E além disso um dos animais começou a mijar-se sem parar. Não sei se era de medo, se era de nervos, se era o quê. Sei que só então fui capaz de abrir realmente os olhos, ver o logro dos meus pais, dar-me conta do horror de tudo aquilo.
Ultimamente tenho lido vários textos sobre o sofrimento do touro. Agradeço a todos os que os escreveram. Que ninguém mais volte a conseguir acreditar que as bandarilhas não doem, e que as touradas não provocam um sofrimento terrível ao touro.
Este, que partilho a seguir, estava no blogue Pró Touro - pelos touros em liberdade.
Jose Sepúlveda, técnico de som do Canal
Nou e que durante algum tempo trabalhou na transmissão de touradas
decidiu relatar aquilo que viu e ouviu durante estas emissões. A imagem
inserida no texto é apenas para ilustração do artigo.
” Sempre que trabalhei na parte sonora das transmissões frequentemente comentava que se em lugar da
banda de música, dos aplausos, dos bravos, dos olés e etc o som fosse
captado pelo Sennheiser 816 (microfone que capta a grande distância e
com muita qualidade) perto da arena onde se escuta perfeitamente o som
das bandarilhas a entrar na pele, os mugidos de dor do animal a cada
tortura que é submetido e além disso se as pessoas acompanhassem os
primeiros planos das feridas, dos coágulos tão grandes como a palma da
mão, do sangue que jorra, do bater do coração ou o olhar do animal antes
da estocada final 90% desligaria a televisão ao presenciar tamanha
chacina ao ritmo de pasodoble.
Eu pessoalmente pedi para deixar
de fazer esse tipo de trabalho, porque um dia em Castellón, tocou-me
estar entre barreiras e fiquei muito incomodado ao escutar um touro
depois do toureiro ter falhado por quatro vezes a estocada e tive que
tirar os auscultadores e o animal agonizava, cuspia, afogava-se no seu
sangue vindo morrer mesmo ao pé de mim apoiado na madeira e o seu olhar
ensanguentado e com lágrimas, sim lágrimas, sejam ou não sejam de dor
cruzou-se com o meu até que um inútil falhou duas vezes o descabelo e eu
disse-lhe tudo e mais alguma coisa.
Foi aí que terminou o meu trabalho em praças de touros para toda a vida.
São sentimentos pessoais e o mais
provável é que um amante da “fiesta” ache ridículo, mas para mim
ridículo é quando depois de semelhante carnificina olhas para o público e
vês que aplaude, come sandes sem qualquer preocupação não tendo visto
nem ouvido o que eu testemunhei”.
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