01 maio 2015

dizer poesia

Esta manhã uma rádio berlinense estava a pedir aos seus ouvintes que telefonassem a dizer um poema que soubessem de cor sobre a primavera. Ouvi alguns. Impressionante: em vez de porem a voz em registo "ar de caso"
(erro habitual de quem diz poesia) 
(outro erro comum é pôr a voz em registo "prisão de ventre"), 
as pessoas entoavam o poema. Tinha tudo: o ritmo, a melodia e o volume certo como o poema pedia - e segundo o que cada segmento do poema pedia. 
Quem dizia aqueles poemas tinha-os entendido. Mesmo os que não tinham a dicção muito boa, mesmo os que a meio se esqueceram de uma palavra ou de um verso, todos eles diziam o poema a partir de um lugar iluminado dentro de si próprios.

Aprenderam na escola, claro, que isto pode-se aprender. Vi nas escolas dos meus filhos, em Weimar. Vi uma miúda de oito ou nove anos a dizer a balada "O aprendiz de feiticeiro", de Goethe, como se fosse uma peça de teatro para uma pessoa só (*). Maravilhosa. Vi outros, de dez anos, a declamar de cor um poema muito divertido, no dialecto de uma região a norte de Berlim, e a turma a dizer a cada um deles o que é que estava bem na sua interpretação, e o que podia ser melhorado.

Enquanto os ouvia hoje na rádio, pensei em algumas aulas da Elisabeth Schwarzkopf, e do modo como ela insistia com os jovens cantores para entenderem a poesia do que cantavam. E lembrei-me do ensaio desta semana para a ópera que vai ser apresentada em Junho. Parámos algum tempo na frase "Die Kinder sind, die Kinder sind zum Tod verdammt!" (as crianças estão, as crianças estão condenadas à morte!). O maestro lembrou-nos que nós, atenienses, estávamos gagos de pavor, e não avançou enquanto não cantámos com a entoação certa: "die KINDER sind, die Kinder sind ZUM TOOOD verdammt". Mais uns ensaios com este maestro e vou ser capaz de entoar poesia. Mas o que eu gostava mesmo era de ter frequentado a escola dos meus filhos em Weimar. 



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