25 fevereiro 2015

Grécia e Europa: assim, o jogo não funciona

Este artigo é como o namorado mais recente: todos os outros que partilhei eram apenas o caminho que me trouxeram até aqui. É um texto de opinião de Henrik Müller, como o anterior, e foi publicado no Spiegel Online ao fim do dia 21.2.2015 (ultimamente a História ganhou tal velocidade que quase é preciso escrever o segundo exacto em que acontece). Gostei de o ler porque analisa o que correu mal no diálogo entre a Europa e a Grécia e porque nos aponta perspectivas de futuro. Resta saber se é por aí que queremos ir.



Grécia e Europa: assim, o jogo não funciona

por Henrik Müller


Griechischer Finanzminister Varoufakis: "Keine bindenden Absprachen"

Ministro das Finanças Varoufakis: "os acordos não são vinculativos"

O ministro Varoufakis arriscou e perdeu. No entanto, é um especialista em teoria dos jogos - devia saber como é que as negociações funcionam. O problema: o jogo europeu já não funciona, precisa de regras novas. 

Para já o desastre foi adiado, mas o drama continua. Após várias reuniões de crise, os ministros das Finanças da Zona Euro acabaram por se entender quanto à permanência da Grécia no Euro. Ao menos isso. Só não se sabe se a coisa resulta ou não. Ao cabo de cinco anos de programas de ajuda, medidas de austeridade e reformas, pode ser que a Grécia ainda venha a cair do Euro. Seria, possivelmente, o princípio do fim da união monetária. Não imediatamente, mas a longo prazo.

Como foi possível chegar tão longe? Que condições específicas vigoram na Europa, que não existem em mais lado nenhum do mundo? E como seria possível alterar as regras para conseguir estabilizar a Zona Euro a longo prazo?

Comecemos pelo ministro grego. Giannis Varoufakis, como foi repetidamente referido nas últimas semanas, é especialista em teoria dos jogos. Um especialista do ramo da Economia que analisa o comportamento de pessoas racionais em situações de conflito - por exemplo, em negociações ou em competições.

Um dos jogos de estratégia mais simples é o chamado Chicken Game, como aparece por exemplo no American Graffiti de George Lucas: dois carros dirigem-se um ao outro, e quem se desviar primeiro perde. A princípio, tínhamos a sensação que o novo governo grego estava a jogar segundo o guião do Chicken Game. Um jogo "não cooperativo", como é chamado no jargão. Lemos o que Varoufakis escreveu: "Nos jogos não cooperativos não há acordos vinculativos. Os jogadores podem dizer o que lhes apetece, quando lhes apetece - não há nenhuma instância externa que os obrigue a cumprir aquilo a que se comprometeram." É o que se lê na página 113 do livro Game Theory, que ele publicou em 1995, em colaboração com Shaun Hargreaves Heap.

Por vezes é razoável recuar

Isto é a teoria. Na realidade política, este quero-lá-saber-do-que-disse-ontem não funciona. Varoufakis teve recentemente a prova disso: viu-se sozinho perante a maior coligação possível, os ministros das Finanças dos restantes 18 países do Euro.

Formulado em termos de teoria dos jogos: na zona Euro temos um "superjogo com horizonte temporal ilimitado". Os actores não se reunem apenas uma vez, mas repetidamente. Num contexto destes, há outras estratégias que garantem mais sucesso: quem tenta levar a melhor sem contemplações pode ser castigado pelos outros na rodada seguinte.

Em compensação, quem actua de modo cooperativo, pode ser recompensado com cooperação. Ou seja: é boa ideia recuar ocasionalmente, ao contrário do que acontece em situações simples de jogo. A previsibilidade compensa. Confiança e credibilidade são as categorias decisivas.

O que explica as atitudes de Wolfgang Schäuble: não se desvia do seu rumo - ajuda sim, mas com duras condições; não haverá passagem para uma "União de transferências"; redução da dívida, mesmo que dure muito tempo. É legítimo perguntar se esta atitude é correcta do ponto de vista económico. Do ponto de vista político, contudo, tem tido sucesso: o número dos seus adeptos na Zona Euro tem vindo a crescer - os espanhóis, os irlandeses, os portugueses e a maior parte dos países de Leste mostram-se pouco inclinados a continuar a ajudar a Grécia com condições especiais.

Até agora tem tido sucesso - esta restrição é importante. Porque mal a Zona Euro - e com ela o conjunto do projecto de integração europeu - começar a vacilar, a Alemanha incorrerá em custos políticos e económicos desastrosamente altos.

O sistema actual está a vacilar

A crise grega mostra a fragilidade do edifício da união monetária. Problemas económicos crónicos podem conduzir a situações fora de controlo. Hoje é a Grécia que está em causa, no Outono será talvez a Espanha, depois do próximo ano eventualmente uma França governada pela Frente Nacional.

A Zona Euro pode continuar a jogar um superjogo, mas este continua a ser um jogo não cooperativo.
Os representantes de governos soberanos negoceiam uns com os outros. Isto só funciona enquanto a grande maioria estiver de acordo quanto à direcção. Se não houver acordo, não há qualquer instância que os force a isso.

Há duas possibilidades de chegar a uma constelação estável a longo prazo:

- Ou há uma superpotência, superior aos outros, que cria uma estabilidade hegemónica e uma ordem internacional à qual os outros se sujeitam. Tal como os EUA depois da II GM. Na Europa actual teria de ser a Alemanha a tomar esse papel.

- Ou a Zona Euro consegue dar o salto para o mundo dos "jogos cooperativos". Cria-se uma instância superior, que goza de legitimidade e está em condições de exigir a vinculação dos Estados àquilo que foi acordado. Quem ferir os tratados será chamado à responsabilidade.

A Alemanha - a "potência hegemónica relutante" (como lhe chamou The Economist) - com o papel de poder dominante na Zona Euro é uma solução insustentável dos pontos de vista político e económico. Só uma solução federal pode trazer estabilidade à Zona Euro.

Neste novo jogo serão possíveis mecanismos estatais federais de redistribuição (condicionada) e de partilha do risco, sem os quais uma zona monetária não pode funcionar. Um Parlamento especial da Zona Euro tomaria decisões sobre o Orçamento, financiado pelos seus próprios impostos. Uma parte das dívidas nacionais seria coberta por Eurobonds. O próprio fundo de salvamento do Euro (ESM) seria controlado por este Parlamento. Seria introduzida uma base de apoio social igual para todos os países. Um governo e um ministro das Finanças da Zona Euro teriam poder de agir sobre os Estados membros.

Esta é, sem dúvida, uma visão audaciosa. Há alguma possibilidade de vir a ser posta em prática em breve? Não. O drama continua.  



Zum Autor

  • Roland Bäge
    Henrik Müller ist Professor für wirtschaftspolitischen Journalismus an der Uni Dortmund. Zuvor arbeitete der promovierte Volkswirt als Vize-Chefredakteur des manager magazin. Außerdem ist Müller Autor zahlreicher Bücher zu wirtschafts- und währungspolitischen Themen. Für SPIEGEL ONLINE gibt er jede Woche einen pointierten Ausblick auf die wichtigsten Wirtschaftsereignisse der Woche.

2 comentários:

Gi disse...

Os Estados estariam dispostos a abdicar formalmente da aparência de soberania que lhes resta?
Não me parece.
A hegemonia alemã, relutante ou não, parece inevitável mas é odiada e temida.
Faz falta uma Inglaterra forte.
Apenas algumas ideias um tanto confusas.

Helena Araújo disse...

Confusos andamos nós todos. :(