O meu país, a
União Soviética, era não apenas uma ditadura totalitária mas também uma união
voluntária de muitos povos, que deviam coexistir de forma pacífica e solidária.
O rapazinho gostava disso. Só não sabia até que ponto essa aliança era autêntica.
Em 1991, a aliança desfez-se. “Não perdem pela demora, traidores!”, pensou o
rapazinho, que entretanto crescera e se tornara presidente. “Ou voltamos a
ficar amigos, ou verão com quantos paus se faz uma cangalha. Vamos começar pela
Crimeia.” Na realidade, conseguiu que todos se zangassem. Parentes, amigos,
colegas de trabalho. Operários e camponeses, pensadores e poetas, o mundo
inteiro. Algumas barricadas surgiram no meio das cozinhas, o homem a favor, a
mulher contra. Uma parte da sociedade sente vergonha, outra rebenta de orgulho
e, com tanto patriotismo, mal consegue andar. A maioria acha bem, o país vai
ficar maior, a Crimeia é nossa. O referendo de domingo é à prova de bala, nove em
cada dez balas vão ser a favor, calculo eu.
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