19 dezembro 2013

postais de Natal



No terminal rodoviário do Tietê, em São Paulo, um grupo de voluntários escreve postais ao serviço dos passageiros. Um deles, Gustavo Oliveira, de 18 anos, conta (transcrevo da notícia na Folha):


Ela chegou confiante. Puxou a cadeira na minha frente do outro lado da mesa. Sentou-se. Em suas mãos, passaram os quatro modelos de cartões de Natal que temos.
Olhou cuidadosamente cada um deles. Ensaiou pegar uma caneta, mas não avançou. Daí, ficou desconcertada. Cabisbaixa, olhou bem nos meus olhos e confessou com a voz engasgada que não sabia ler nem escrever.
Disse ter 23 anos de idade e ter deixado Manaus para trabalhar como doméstica em São Paulo. Veio mesmo atrás do marido. Era bem bonita.
Com ela, trouxe o filho, de sete anos. Tudo isso ela me contou ali, enquanto ensaiava algumas frases para que eu colocasse em seu cartão de Natal. De certo apenas o destinatário: o marido que ela iria deixar por aqui.
Eu até que mostrei as seis listas com as sugestões de frases, mas aquela moça, como tantos outros que passam diariamente pelo Terminal Rodoviário do Tietê, em São Paulo, prefere assim: contar um pouco da sua história para que, a partir dela, eu ou os meus colegas escrevamos o que a gente achar melhor.
Pergunto sobre a relação deles com os parentes. Afinal, a expressiva maioria dos cartões de Natal que escrevo é endereçada a algum familiar.
Ao fechar o envelope, a sensação que aquela moça me passou foi a de que estivesse encerrando um ciclo de sua vida. Como se dissesse adeus ao marido. Percebi que tal rompimento ainda não estava bem resolvido para ela.
Ao se despedir, ela me contou que iria visitar uma tia-avó que mora no Espírito Santo. Nem ela parecia acreditar que a viagem seria curta. Voltou-se para o menino, segurou a mão dele e partiu.

(...)

Ao escrever cada palavra, frase, cartão de Natal, eu me sinto um pouco realizado.
Quando coloco o cartão no envelope, tenho a sensação de que é possível, sim, tornar esse mundo ao menos um pouco mais humanitário.

Ou será que estou apenas sob o efeito do Natal?

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