11 janeiro 2013

Pepa, ou: isto é só boas notícias

Boa notícia 1: Há uma miúda em Portugal que está a poupar dinheiro para comprar uma coisa cara. Não está a pensar cravar a coisa cara aos pais, não está a pensar "arranjar esquemas", não está a pensar pedir emprestado ou usar o cartão crédito - está a poupar dinheiro. Tão gira!

Boa notícia 2: Há uma miúda em Portugal que - sabendo embora que tem um desejo consumista - está a fazer um extraordinário exercício de disciplina de gastos para conseguir comprar algo que quer. E que sente como realização pessoal conseguir poupar todo esse dinheiro. Pensava que já não havia disto nesta nossa cultura de gastar agora e pagar depois, mas afinal parece que há.

Boa notícia 3: Os desejos consumistas desta miúda provocaram uma onda de choque em todo o país, e foram muito criticados por pessoas que entendem que isso não é maneira de estar na vida. Numa primeira fase, os críticos confrontaram a miúda com os seus consumos; numa segunda fase, confrontaram-se a eles próprios sobre o estilo de vida que têm, e decidiram que a partir de hoje vão fazer uma vida o mais frugal possível para, com o dinheiro que lhes sobrará, ajudarem famílias atingidas pela tragédia do desemprego. O dia 11 de Janeiro de 2013 entrará para a história como o início de uma nova fase da humanidade, a Era dos Fazistas: o tempo das pessoas que fazem o que pensam que deve ser feito, em vez de gastarem tempo a criticar os outros.

18 comentários:

Anónimo disse...

Não podia discordar mais de si Helena. É certo que a blogger é uma jovem, provavelmente imatura, e tem o direito de comprar o que bem entender com o seu dinheiro (seja poupando, seja a crédito). Agora alguém que se expõem daquela forma deve pesar não só o que diz, mas sobretudo como o diz ( isso é um axoma desde o debate Nixon-Kennedy) e em que contexto/ para que público o diz.A campanha chocou-me menos pela mala ou pelo desejo consumista (todos os temos, eu gasto balúrdios em livros e nalguns casos arrependo-me e muito) mas pela sacralização da imagem, da fancaria, do Schein. Preocupa-me que algumas destas pessoas sejam opinion makers ou modelos para milhares/milhões de pessoas. A Pepa ("figura pública") pode ser criticada? Pode (como pode a Helena ou eu, ou qualquer outra pessoa que escreva num espaço público como o de um blog) desde que a crítica se mantenha acima da linha da cintura. O único ponto em que concordo consigo é que deveriam existir mais "fazistas".

Espiral disse...

Chama-me cinica, mas duvido muito que ela vá fazer sacrificios para poupar para comprar aquela mala; parece-me mesmo bitaite para ver se a oferecem (pais, namorados ou marcas deste mundo).

Chama-me cínica, mas ao ver o que se passa pela blogosfera fora isto não me surpreende (oh que há mais aí é pedinchoes camuflados).


Não fui das que andou a gozar com ela, nem em facebooks nem em blogs, mas também não acho que seja uma santa a mandar um bitaite pueril.

Helena Araújo disse...

Helena,
copio para aqui a resposta que dei a este comentário no facebook:

O fenómeno "bloggers de moda" é algo que me mete nojo e me deixa desconcertada: como é possível tanta futilidade? Como é possível serem tão medíocres e terem-se em tão alta conta? Como é possível terem um público tão vasto?
A partir deste meu desagrado, faço o quê? Conheço bastante bem os limites do meu poder. O mundo não é como eu gostaria que fosse, e não vai melhorar se eu queimar esta miúda na praça pública. Mas é o que estamos a fazer. Para mim, a onda de escárnio que percorreu a internet é totalmente abaixo da linha da cintura. Podemos e devemos questionar tudo isso - a sacralização da imagem e da fancaria, da futilidade - mas temos de pensar numa estratégia que abra perspectivas aos outros, em vez de os humilhar com a nossa superioridade.
Se vamos criticar a miúda, convinha estarmos conscientes dos nossos próprios telhados de vidro. E era bom sabermos falar sobre as ideias e os fenómenos sociais, em vez de bater nas pessoas concretas.
Uma outra questão é que esta miúda podia ser a minha filha, e eu quero tratar os outros como gostaria que outros tratassem a minha filha.

Uma última achega: no seu post sobre o assunto há muito material para um bom debate. Discute sobretudo o fenómeno, e não a miúda. O que tenho estado a escrever aqui não é, de modo algum, uma reacção ao seu post.

Helena Araújo disse...

Espiral,
chamo-te cínica, hehehe. ;-)

Não sei nada sobre essa miúda, nem quero saber. Estava a ser sincera, estava a fazer uma jogada? Isso é o que menos me interessa discutir.

Cristina Torrão disse...

Há uma miúda em Portugal que tem uma voz irritante e uma dicção horrível. Tão gira!

P.S. Por este andar, com 80 anos, a Helena está a defender "miúdas" de 60, por poderem ser suas filhas. O ser jovem não pode servir de desculpa para tudo.

Maria J Lourinho disse...

Quanto mais desiguais, mais intolerantes, Helena. Estamos a chegar ao perigoso grau de tolerância zero.
http://1diaatrasdooutro.blogspot.pt/2013/01/o-caso-da-mala-chanel.html

Helena Araújo disse...

Cristina,
haver uma miúda a dizer que quer poupar para comprar uma coisa cara, e que, se conseguir realizar isso, será uma conquista, é giro.
A voz é irritante, a dicção parece-me ser um problema que um terapeuta da fala pode resolver.

E quem diz "a minha filha" pode dizer "eu própria". Ninguém está livre de fazer uma triste figura na internet ou na televisão. Digo eu, que já tenho aqui um bela colecção de cenas que me envergonham. Mas por sorte nunca caíram assim em cima de mim.

Helena Araújo disse...

Maria de Jesus,
pois é: casa onde não há pão...
:(

Duluoz disse...

Admiro o homem que se consiga apaixonar por uma amostra dessa espécie. Sinceramente.

Helena Araújo disse...

Duluoz,
não fale de pessoas como se fossem animais.

Não há nada no vídeo que me faça simpatizar com a mocinha, mas sei que há gostos para tudo. Não estou nada preocupada com isso.

Duluoz disse...

Não falei de animais. Apenas uma amostra da espécie humana. Que somos.

Helena Araújo disse...

Ah, queria dizer: "por essa amostra da nossa espécie". OK, percebi agora.

Cristina Torrão disse...

Precisa de uma terapeuta da fala, sem dúvida!

Helena Araújo disse...

Também me pareceu, Cristina.
Pareceu-me que tem de exercitar os músculos da boca, aprender a articular melhor. Muito trabalho!
Isso costuma fazer-se com os miúdos quando eles vão para a escola primária. Será que nesta idade ainda é possível fazer alguma coisa? (Não percebo nada disso, como se vê)

sem-se-ver disse...

já reparaste que as 3 'boas notícias' que elencas são todas elas 'más notícias', sem alterar o conteúdo do que nelas escreveste? :)

Helena Araújo disse...

sem-se-ver, não percebi bem a tua questão. Podes explicar um pouco melhor?

Quanto às minhas "boas notícias":
- quis provocar
- as primeiras duas referem-se a algo positivo: uma pessoa jovem que está a poupar dinheiro em vez de cravar outras, que é o mais habitual; e um poupar antes para gastar depois, que já não se usa muito;
- a terceira era obviamente uma ironia.

Cristina Torrão disse...

Bem, ela veio agora dizer que estava nervosa (no que diz respeito à dicção).

Enfim, espero que ela possa aprender algo com este episódio, cair mais na realidade, pois penso que será esse um dos seus problemas: viver um pouco a leste da realidade. Com 25 anos, já vai sendo tempo...
E não se preocupe, Helena, não me parece que ela seja do género de fazer certas asneiras, que desemboquem em tragédia.

Os senhores encarregados da campanha publicitária também podiam ter tido um pouco mais de cuidado. Presume-se que serão especialistas da comunicação.

Helena Araújo disse...

Cristina,
provavelmente foi mesmo isso: ela terá pensado que estava a falar apenas para o tipo de público que tem no seu blogue.
Quanto a quem fez a campanha da Samsung: em termos de competência, ainda têm um bom bocado para andar.