24 novembro 2011

sinfonia 45 de Haydn, também conhecida como "sinfonia da despedida"

Hoje, por ser dia de protesto, uma amiga lembrou-me esta "sinfonia da despedida", a que está ligada uma história interessante. Vi-a uma vez, algures por cá, com um público que teve alguma dificuldade em conter o riso perante a saída a conta-gotas da orquestra.

Aqui podem ver os momentos finais de uma interpretação de Barenboim,



e no vídeo seguinte todo o quarto andamento:



Muitas vezes se conta que os músicos tiveram ordens para, durante o adágio, abandonar a orquestra segundo uma ordem determinada. Esta hipótese baseia-se no seguinte relato:

Havia um regulamento que impunha que os músicos da orquestra viessem no princípio do Verão para o palácio Esterhaza, mas sem as suas famílias. Por esse motivo, durante todo o Verão os músicos não tinham contacto com as famílias, à excepção de dois cantores, o violinista Tomasini e o próprio Haydn. O motivo apresentado era a exiguidade do espaço para alojar tantas pessoas. Quando os músicos se queixaram de terem saudades da família e despesas dobradas, o príncipe pagou-lhes sem hesitar um suplemento. Para ele, o mais importante era não ter de ver as mulheres e os filhos dos seus serviçais.
A saison do Verão de 1772 prolongou-se demasiado, e os músicos pressionaram Haydn para tomar o partido deles junto do príncipe. Sobre esse concerto, Jacob relata: „Após não mais que 100 compassos, todos os instrumentos pararam repentinamente na dominante de Fá sustenido: quatro violinos iniciaram de modo completamente inesperado um tema que até ali não tinha sido ouvido. Arrastavam-se e afastavam-se uns dos outros. Algo incrível aconteceu para os lados do segundo trompista: ele, e o primeiro oboísta levantaram-se a meio da peça, arrumaram os seus instrumentos e abandonaram o palco. Onze compassos mais tarde o fagotista, que até então não tivera nada que fazer, pega no seu instrumento e, juntamente com o segundo violino, repete em breve uníssono o início do primeiro motivo; a seguir, apaga a sua luz e sai também do palco. Após sete compassos é seguido pelo primeiro trompista e pelos segundo oboísta. Agora é a vez do violoncelo, que até então acompanhara o contrabaixo, de se afastar deste: durante uma viragem da música -  quando inesperadamente surge um dó menor como dominante - o contrabaixo ergue-se e sai da sala. A música vai-se tornando cada vez menos potente, mais ténue. Haydn, ao piano, continua a dirigir, como se não se desse conta de nada. Alguns compassos do adágio em lá maior. Contudo, enquanto estes ressoam, o violoncelo, o terceiro e o quarto violino e a viola desaparecem um após o outro.
O palco está quase às escuras. Só numa estante ardem ainda duas velas: junto a Luigi Tomasini e um segundo violino, que têm a última palavra. Os violinos soam muito baixo, usam abafadores. Entrelaçam-se em tercinas e sextinas, para a seguir quase morrerem num sopro leve. Agora apagaram-se também as últimas luzes, os últimos violinistas levantaram-se e desapareceram como sombras na parede: sobre a audiência espalha-se o bafo de uma solidão outonal. Quando Haydn se prepara para sair em bicos de pés, o príncipe aproxima-se e pousa-lhe a mão levemente sobre o ombro: "Meu caro Haydn, entendi a mensagem! Os músicos têm saudades de casa... Muito bem! Amanhã fazemos as malas..." 
Na sala da entrada, a orquestra espera ansiosa o seu mestre. Será que a amável partida resultou? Mas eis que ele chega já, e mais que as suas palavras, o seu rosto revela o bom resultado da empresa. Com abraços levam-no para fora."

Devido a este relato, Schweikert (1988) vê no primeiro andamento um confronto musical entre o príncipe (primeiro tema) e os músicos com o tema que "implora".
Segundo o jornal „Wiener Blättchen“ de 19. Julho 1787 terá sido o clarinete o último instrumento a abandonar a orquestra. No entanto, nesta orquestra nem sequer está previsto um clarinete.
Johann Matthias Sperger compôs em 1796 uma "sinfonia da chegada" em oposição a esta "sinfonia da despedida".


Webster vê toda a peça como descrição dos sentimentos dos membros daquela orquestra: por exemplo, o cansaço dos músicos, ansiosos por voltar para casa, está representado no pouco usual tom de fá sustenido maior, que simbolizaria o lar quase inalcançável.
Marggraf tematiza, a partir de um relato feito provavelmente por um aluno de Haydn, Ignaz Pleyel, segundo o qual o príncipe Nicolau sofreria de depressões. Para o animar, Haydn compôs uma nova sinfonia, pela qual o príncipe, contudo, não se interessou. Haydn ficou muito chocado e no dia seguinte pediu a sua exoneração. „Este andamento final – provavelmente o mais estranho de toda a literatura sinfónica - encerra uma sinfonia que insiste de forma única na representação de conflitos profundos; não se trata de um gracejo musical, mas da descrição de algo dramático e chocante, pleno de luto e trágico, que talvez devêssemos ver como o eco de uma grande catástrofe afinal evitada.“
No manuscrito original não se encontra qualquer indicação para abandonar os lugares; apenas nas cópias, das quais só uma foi feita perto da data da composição desta obra. Alguns autores têm dúvidas que tal cena pudesse ter acontecido justamente em Esterhaza, com toda a sua etiqueta e a estrutura fortemente hierárquica. Talvez este final seja „apenas para considerar como mais um final experimental dos anos 1771/72, sem qualquer motivo simbólico ou alegórico“?
Uma síntese das outras teorias sobre esta obra, apresentada por van Hoboken (1957). Nenhuma delas está suficientemente documentada (tal como a anteriormente apresentada):
  • Dificuldades financeiras teriam levado o príncipe a dissolver a orquestra.
  • Com esta interrupção, Haydn queria ridicularizar alguns músicos que lhe pareciam demasiado impertinentes.
  • Haydn teria escrito um contraponto para esta sinfonia, o qual se inicia com os dois violinos, e os restantes músicos vão entrando a pouco e pouco. 
***

Isto é tudo sabedoria da wikipedia alemã. Infelizmente as versões francesa e inglesa são muito mais sumárias, pelo que teve de ser o Speedy Gonzalez a traduzir.

    8 comentários:

    sem-se-ver disse...

    tudo isso é sabedoria da biografia para crianças de haydn que li na dita cuja infancia!

    e sempre delirei com a história... :)

    (eu a comentar este teu e um teu comentário no meu a cair no meu outlook! :D

    snowgaze disse...

    ja que te deste ao trabalho de tradzir, podias colocar na wikipedia portuguesa... :)

    Gostei :)

    Helena Araújo disse...

    snowgaze,
    Podia, sim, mas aquilo está cheio de links para os verbetes dos autores e mais referências bibliográficas - não tenho tempo para fazer esse trabalho assim bem feito. E esta tradução é do Speedy Gonzalez, esse raaaaaaaaaapido, raaaaaaaapido.
    Achas que mesmo assim podia pôr o que está na wikipedia, com uma nota a dizer que é tradução do verbete alemão?

    Gi disse...

    Helena, um post muito apropriado.

    Helena Araújo disse...

    Gi,
    Quem se lembrou disto foi a Antena 2, parece-me. Eu limitei-me a mudar de assunto, e a perder-me por fás sustenidos e dós maiores...
    ;-)

    sem-se-ver disse...

    sim, acho

    (resposta à tua pergunta sobre a wiki)

    snowgaze disse...

    (tarde e mal, que estas coisas perdem-se no reader):
    sim, acho. De qualquer forma, depois "alguém" edita e junta as fontes, especialmente se sinalizares o artigo como uma tradução do alemãp... ;)

    Helena Araújo disse...

    OK, tu mandas!