23 novembro 2011

parlamento alemão pede desculpa às vítimas dos neonazis




Discurso de Norbert Lammert, Presidente do Parlamento Federal Alemão, no dia 22.11.2011:

Em nome do Parlamento Federal Alemão e de todos os seus membros, quero exprimir o pesar, a consternação e o choque que a assustadora série de assassínios e ataques perpetrados por um bando de neonazis nos causaram.
Sentimo-nos profundamente envergonhados pelo facto de os serviços de segurança dos Estados e da Federação se terem mostrado incapazes, ao longo destes anos, de desvendar atempadamente e de evitar estes crimes. O nosso coração está com os familiares das vítimas; às vítimas e aos seus familiares devemos um pedido de desculpas por certas suspeitas de que foram alvo no decorrer das investigações.
Conhecemos a nossa responsabilidade. Estamos firmemente decididos a fazer tudo o que esteja ao alcance de um Estado de Direito para esclarecer o que se passou e os seus motivos, e para que o nosso país assegure a protecção das pessoas e dos seus direitos fundamentais - para todos os seus habitantes, independentemente da sua origem, religião e orientação.

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Para quem não sabe: no dia 9.11.2011 começou a fazer-se luz sobre uma longa série de assassínios de estrangeiros (oito turcos e um grego), que se descobriu agora ser obra de um grupo de neonazis. A polícia suspeitava de ajustes de contas numa espécie de máfia turca. O país está em choque.
Todos os dias surgem mais pormenores escabrosos. Como, por exemplo, um vídeo encontrado na casa da célula terrorista - "quinze minutos de sadismo", dizia o Spiegel.
Debate-se: como foi possível acontecer fiasco tão grande? E: devemos proibir o partido NPD? Não, responde Stefan Kuzmany, no Spiegel: proibir um partido não evita o terrorismo de extrema-direita, porque o problema não é o partido mas a "borra castanha" - apesar das fragilidades e das incongruências deste partido, houve eleitores em número suficiente para o meter em dois parlamentos; eleitores que não percebem que este partido não aponta um caminho de futuro, mas para o mais sombrio passado. Os actos de terrorismo germinam nesta parte da população que se identifica com os ideais e objectivos neonazis, e não dependem da proibição de um partido. Como resposta a este argumento, diz-se que é vergonhoso o Estado financiar um partido que tem um discurso anti-semita e xenófobo. O problema, acrescento eu, é que as coisas não são tão fáceis de destrinçar. Por exemplo, o cartaz "dar gás" (carregar no acelerador) de que já falei aqui: como provar que o que parece é?

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E agora, para os portugueses que se sentem afrontados quando a Angela Merkel manda palpites sobre Portugal, olhem-me aqui o Erdogan a vingar-vos (de um artigo de 22.11 no Spiegel):

Serviços estatais e assassínios por neonazis


Erdogan aconselha aos alemães que sigam o exemplo turco

Entre as vítimas da célula terrorista de Zwickau há oito homens turcos. O primeiro-ministro Tayyip Erdogan pede que se investigue o envolvimento de serviços estatais alemães no caso, e sugere que se olhe para o exemplo turco.

Ancara - Os assassínios brutais de um grupo de neonazis, de Zwickau, chocou especialmente não apenas a comunidade turca na Alemanha, mas também toda a Turquia - e o tom das críticas aumenta. O primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan, apelou aos investigadores alemães para que analisem atentamente o possível envolvimento de agentes estatais nesta série de assassinatos de extrema-direita. Os crimes não podem ser simplesmente arrumados na gaveta de "actos de neonazis", disse Erdogan perante os deputados do seu partido, o AKP, em Ancara.
(...)
No seu discurso, Erdogan falou não apenas do terror de extrema-direita na Alemanha, mas renovou também as suas acusações contra a acção de organizações políticas e bancos alemães na Turquia. Segundo ele, na Alemanha existem diversos complôs "contra a Turquia, os turcos e os estrangeiros".

(...)
No que se refere à luta contra o terror de direita, a Alemanha pode seguir o exemplo da Turquia. O seu governo lutou contra organizações ilegais "dentro do Estado". Erdogan referia-se às investigações que decorrem desde 2007 contra o Ergenekon, que seria um grupo conspirador que estava a preparar um golpe de Estado. Suspeita-se que cerca de 200 oficiais do exército estariam envolvidos nos planos.

7 comentários:

Maria J Lourinho disse...

OBRIGADA POR TANTAS INFORMAÇÕES, HELENA.

sem-se-ver disse...

eu fico mt nervosa c este assunto, n csg comentar

Anónimo disse...

Boa noite Helena, pessoalmente sou partidário da repressão legal do terrorismo, sem qualquer justificação sociológica. A causalidade sociail situa, mas não pode justificar nem desculpar o que foi feito. Tal como a respeito do terrorismo islâmico; a frustração e o ressentimento não são justificação que legitime a violência. Por isso, não acredito na proibição do NPD a não ser que viole as leis de uma forma suficiente para que isso aconteça. A democracia tem de permitir a existência de movimentos divergentes dentro dos limites estabelecidos. Já a violência terrorista e a ameaça ao estado democrático não deve ser tolerada em nenhumas circunstância carece da mais viva repressão.
Vejamos, este grupos apesar do seu vácuo ideológico (no fundo não são bem nazis, mas uma versão de um nihilismo particular) baseiam a sua capacidade de sedução política na violência libertada pela transgressão pública de um tabú: o nacional-socialismo. A capacidade de provocação e a iconoclastia política são o que conferem um sentimento de poder a quem pertence a um grupo destes. Um imenso e excitante o poder O activista neo nazi é paradoxalmente um pária e alguém poderoso. Quanto mais ignominiosa é a violação do tabú, mais poder tem quem o profana. Se reparar, 300 animalejos destes num cortejo político, mobilizam 500 polícias, 2.000 manifestantes de esquerda mais 1000 mirones e ainda são notícia na televisão e nos jornais. A repressão deve ser efectiva no que vale a pena, e ser inteligente a respeito do resto. Proibir um partido como o NPD, não impede que os jovens de leste formem as Kamaradeschaften como a Thüringer Heimatschutz onde todos este tipos se iniciaram. São movimentos que têm origem no exterior do NPD. E o que dizem os jovens que na antiga DDR se juntam a eles? Que se sentem novamente parte de uma comunidade, que se voltam a sentir gente. No final da DDR o refúgio no que se julga ser conhecido é a protecção do vácuoemocional e da ameaça de um mundo hostil. O fim da ideologia tem de ser preenchido por alguma coisa. Infelizmente a religião não estava lá para ajudar. Para miúdos cujos pais se passaram a sentir impotentes no seu próprio país, inaptos para viver num sistema onde o risco existe, a tentação de retorno ao nacional é uma possibilidade forte.
Nada disto é combatido pela proibição do NPD. Mas deve sê-lo com uma repressão efectiva quando ultrapassarem os limites. O ressentimento não diminui a responsabilidade individual nem a necessidade da sociedade se proteger.
A mim depois do espanto inicial não me surpreendem assim tanto algumas das falhas da investigação e espero é que sejam corrigidas. Depois escrevo um pequeno comentário a respeito deste assunto.
Enquanto português que vive na Alemanha e que adora este país, o assunto interess-me muito.
Pedro

Helena Araújo disse...

m.: de nada, de nada!

sem-se-ver: eu gosto do modo como os alemães reagem - de cabeça fria, começam a investigar rapidamente para mudar as coisas para que isto não volte a acontecer. E os políticos fazem importantes actos simbólicos.

Pedro: esse comentário é tão bom e informativo que devia ser transformado em post. Posso?

Rita Maria disse...

Concordo com o Pedro por um lado, especialmente na questão de a democracia ter de aceitar no seu seio a representação não violenta de organizações que defendem outros modelos de Estado, sob pena de ser democracia apenas no nome.

Mas parece-me que no caso do NPD a questão essencial, que o comentário do Pedro não toca, é a questão do medo e do incitamento ao ódio. Imaginando que não acontece rigorosamente nada e que estes crimes não tinham tido lugar, ninguém tinha batido em ninguém, a coisa ficava por incidentes to tipo daquele que narra a Helena - manifestações públicas, de grupo, de racismo e xenofobia, não violentas de facto, mas suficientes para espalhar o medo entre aqueles a que se dirigem.

Isto não é já suficiente, mesmo que nunca tivesse passado daqui? Estamos a negar a um grupo de pessoas o direito de se sentirem seguras e respeitadas no espaço público - isso já não é só uma 'pequena' suspensão do Estado de Direito?

Anónimo disse...

Bom dia Helena, pode, claro. Se não se importar corrija a pontuação, pois ao escrever de um jacto e à hora a que o fiz tem uma pontuação caótica e muitas deselegâncias de estilo.
Rita, existem inúmeras condenações por incitamento ao ódio e o NPD é tratado no limite da legalidade: para conseguirem um local paraas reuniões são rejeitados em 30 sítios. Faz-se muito mais do que aquilo que está a ser dito. O estado actua nos limites da legalidade e eles têm a vida muito dificultada. Nem sempre será assim, mas é-o em muitas ocasiões. O problema é que há por vezes uma má consciência e hesitação na repressão, o que não me parece que deva acontecer.
Escrevo depois um comentário a respeito da perda de influência eleitoral e efectiva destes movimentos. eles estão em recuo. Só não verifiquei em Berlim, mas perderam posições em todos os novos Länder. O que sucede é que a actividade clandestina criminosa foi divulgada agora.


Pedro

Helena Araújo disse...

Pedro, de acordo: pode-se compreender como é que o terrorismo surge mas não se pode aceitar nem desculpar. A Democracia tem de permitir a diversidade dentro de certos limites. O NPD não é directamente culpado de tudo o que acontece no meio neonazi.

Mas estou a perder o pé, tenho de ir investigar melhor. É que neste momento não consigo distinguir entre NPD e "borra castanha". Ou por outra: distingue-se bem demais. O partido NPD não passa fronteira nenhuma, por isso não pode ser proibido. Mas à sua sombra crescem os tumores neonazis. Ou é alimentado por estes.

Rita, mas que incitamento ao ódio? Eles estão a fazer uso da sua liberdade de expressão...
Como o Sarrazin, por exemplo.
Quando se excedem, não é o NPD, são os "animalejos" dos neonazis. Outra coisa completamente diferente...
Por estes dias tenho-me lembrado muito da imagem da rã dentro de uma panela sobre o fogo. Isto está a aquecer lentamente, de modo que não nos damos conta da situação.
O que está a acontecer em termos de violência latente ou efectiva, e em termos de observadores passivos?
Cada vez tenho menos vontade de atirar pedras ao telhado dos alemães contemporâneos do nazismo.