12 fevereiro 2011

na abertura da Berlinale 2011


Neste site podem ver um pouco da cerimónia de abertura da Berlinale deste ano, que se centra no realizador iraniano, Jafar Panihi, que está preso por seis anos e proibido de filmar por vinte.

Isto é Berlim: uma festa internacional com tanto glamour e improviso como uma festa paroquial...
O director da Berlinale, Dieter Kosslick, nem se preocupa em falar inglês - quanto mais bom inglês. Ontem ouvi-o dizer duas ou três frases, com os "th" todos ditos à maneira alemã, "z"... Ele próprio informou que os alemães o entendem perfeitamente quando fala inglês. A sala riu-se - por estes dias, andamos muito bem dispostos.


Mas o que conta é o espírito da festa - muito caloroso! - e a intenção. Ontem, na abertura, Isabella Rossellini leu uma carta aberta de Jafar Panahi. Tiveram a gentileza de ligar a Panahi, no Irão, para que ele pudesse ouvir a leitura e os aplausos que se seguiram. Antes da leitura, Dieter Kosslick  referiu os riscos envolvidos nesta decisão, e pediu desculpa aos "amigos americanos". É para todos claro que depois disto não há qualquer esperança de conseguir que Panahi seja libertado para participar como júri nesta Berlinale. Nem nas da próxima década.

Aqui está o texto, em inglês:

The world of a filmmaker is marked by the interplay between reality and dreams. The filmmaker uses reality as his inspiration, paints it with the color of his imagination, and creates a film that is a projection of his hopes and dreams.
 
The reality is I have been kept from making films for the past five years and am now officially sentenced to be deprived of this right for another twenty years. But I know I will keep on turning my dreams into films in my imagination. I admit as a socially conscious filmmaker that I won’t be able to portray the daily problems and concerns of my people, but I won’t deny myself dreaming that after twenty years all the problems will be gone and I’ll be making films about the peace and prosperity in my country when I get a chance to do so again.
 
The reality is they have deprived me of thinking and writing for twenty years, but they can not keep me from dreaming that in twenty years inquisition and intimidation will be replaced by freedom and free thinking.
 
They have deprived me of seeing the world for twenty years. I hope that when I am free, I will be able to travel in a world without any geographic, ethnic, and ideological barriers, where people live together freely and peacefully regardless of their beliefs and convictions.
 
They have condemned me to twenty years of silence. Yet in my dreams, I scream for a time when we can tolerate each other, respect each other’s opinions, and live for each other.
 
Ultimately, the reality of my verdict is that I must spend six years in jail. I’ll live for the next six years hoping that my dreams will become reality. I wish my fellow filmmakers in every corner of the world would create such great films that by the time I leave the prison I will be inspired to continue to live in the world they have dreamed of in their films.
 
So from now on, and for the next twenty years, I’m forced to be silent. I’m forced not to be able to see, I’m forced not to be able to think, I’m forced not to be able to make films.
 
I submit to the reality of the captivity and the captors. I will look for the manifestation of my dreams in your films, hoping to find in them what I have been deprived of.




11 comentários:

Paulo disse...

Berlim não é Cannes. Aí é que está a graça.

sem-se-ver disse...

(pu-lo esta manhã em portugues; a cerimonia tb ja esta no youtube)

Helena Araújo disse...

Paulo,
pois é. Quer dizer: não faço a menor ideia de como é Cannes. Mas isto aqui parece um bocadinho o São João do Porto. Sem martelinhos nem mangericos.
Uma festa popular.

Sem-se-ver,
pelos motivos que já tenho explicado (entre outros: gasto mais tempo a comprar o bilhete que a ver o filme) não tenho tido muito tempo para ver o que os blogues têm escrito. Que vergonha, chover assim no molhado, e ainda por cima em estrangeiro...

Helena Araújo disse...

Afinal parece que agora é manjericos - ai este acordo ortográfico!..
;-)

Ant.º das Neves Castanho disse...

Pois eu acho muito bem que o Herr Kosslick não se sinta obrigado a falar Inglês numa cerimónia cultural em Berlim. Era só o que faltava! Mas, afinal, já só os anglófonos é que têm direito à Cultura?! Fiquem-se lá com o exclusivo mundial do seu linguajar na Informática, no "marketing" e no "show-biz", que até já levam mais do que uma Língua tão prosaica e tão rafeira merece!


Bessangana...

Helena Araújo disse...

É que diz que é um festival internacional.
A sala está cheia de convidados que não entendem uma única palavra de alemão. Não faz sentido convidar estrangeiros e falar para eles numa língua que não entendem, não é?

Olha que o inglês não é tão prosaico e rafeiro como isso. Isso é o inglês de aeroporto (como alguém dizia outro dia por aqui), que não é a mesma coisa...

Rita Maria disse...

Na verdade, de acordo com os entendidos, até é a língua com maior vocabulário existente (Rita Maria, defensora das línguas indefesas)...

Ant.º das Neves Castanho disse...

Não tenho nada contra o Inglês, como é óbvio. O que me irrita não é a Língua inglesa, mas sim a submissão acrítica ao Inglês como atitude cultural e mental. Que acaba por ser uma submissão tácita à dominação ocidental global, económica e política. Com os resultados que se conhecem...

Rita, indefesas estão já neste momento quase todas as outras Línguas, but the English itself!

E qualquer dia, por este andar, até entre portugueses, ou entre lusófonos, nos entenderemos melhor em Inglês, do que em Português (ainda no Domingo um Maestrozinho português, muito novinho, virado para todos nós no ensaio dizia, "vamos assim como que fazer todos um... «statement», sim, como é que se diz «statement» em Português?". Pois é...

Ant.º das Neves Castanho disse...

Caramba, Helena, na própria Capital de um País tão tecnológico nunca ouviram falar de "tradução simultânea", aquela coisa que nos faz pôr umas geringonças nas orelhinhas? Olha, aqui em Portugal é muito frequente, em meros e despretensiosos fóruns técnicos internacionais...


Para mais num ambiente cultural, não há-de haver tanta alminha que entenda uma Língua das mais eruditas, como é o Alemão (obrigatório em Portugal, como o Italiano, para quem segue Música...)?

Helena Araújo disse...

A.Castanho,
tradução simultânea para três frases antes do filme parece-me um pouco exagerado. Mas eles têm um sistema qualquer de tradução para filmes que não passam em inglês. Numa das sessões havia uns espanhóis que tinham isso.

Quanto aos de "expressão portuguesa", bingo: os portugueses e brasileiros que traduziram uma parte do sistema da Microsoft para portugalês e brasileiro falavam inglês entre si. Por via das dúvidas.

Essa do "statement" - e como essas, tantas outras! - dá-me logo vontade de aplaudir a lei francesa que obriga a traduzir tudo, e a inventar palavras francesas se necessário for. Tudo, menos deixar que a língua seja invadida por palavras estrangeiras. Clap clap clap.

Ant.º das Neves Castanho disse...

Pois, tás a ver? Essas três frases simples ditas em Alemão têm um significado cultural completamente diferente, ainda que meramente sibólico, do que se tivessem sido ditas em Inglês. A vida precisa de símbolos e a Cultura, embora às vezes de facto não pareça muito, também é vida!


Acaso não reparaste na onda de orgulho que varreu Portugal, de lés-a-lés, igualmente só por causa de três frases, muito simples, proferidas pelo José Mourinho, mas em Português, em vez de Inglês, para todo o Mundo?


E se tu te preocupas com os convidados "internacionais" que podem não saber Alemão (mas que estão proibidos de não saber Inglês...), eu posso preocupar-me ainda mais com os convidados estrangeiros que não saibam Inglês, mas que até podem saber bem Alemão, como os checos, os húngaros, os austríacos, os polacos, os turcos, etc....