Mais uma iniciativa da Filarmonia de Berlim na área do trabalho com a juventude: o décimo encontro de orquestras juvenis desta cidade. Foi ontem de manhã, e eu consegui duas dúzias de bilhetes gratuitos que distribuí pelos amigos. De modo que o meu domingo já começou bem: com um belo grupo de gente de quem gosto.
No início, apanhei um grande susto: anunciaram que Sir Simon Rattle não podia dirigir, porque estava doente com uma terrível gastroenterite (e eu a pensar: olha que estranho, os deuses também têm disso?!) e as primeiras duas orquestras tocaram como, enfim, orquestras escolares (e eu a pensar: ai!, que fiz eu aos meus amigos, que se levantaram mais cedo num domingo de manhã por recomendação minha, e afinal? depois disto nunca mais ninguém gosta de mim, vou acabar a morrer sozinha, nem as Finanças hão-de querer saber).
O meu destino foi salvo por Taner Akyol, compositor, cantor e músico turco que vive na Alemanha, que cantou "Göçmen" (expatriados) acompanhado pelo seu alaúde e pela orquestra. Uma combinação excelente e muito bem interpretada, mostrando bem como as diferenças culturais podem resultar num enriquecimento para todos, em vez de constituírem uma ameaça.
A partir daí, foi sempre a melhorar. A incrível qualidade da execução e da interpretação faria inveja a algumas orquestras profissionais, de tal modo que simplesmente me esqueci que estava a assistir a orquestras de teenagers que fazem música como hobby.
Na primeira parte do programa passaram pelo palco sete orquestras, a última das quais tocou uma peça composta pelo próprio grupo, a partir da suite para orquestra The Planets, de Gustav Holst. Tratava-se do projecto "orquestra criativa", que reuniu duas dúzias de instrumentalistas de várias escolas para, no decorrer de vários workshops de composição e improvisação, compor uma peça nova baseada no tema de uma existente.
Na segunda parte do programa uma orquestra de quase duzentos músicos interpretou magistralmente o Jupiter, the Bringer of Jollity, de The Planets. E, entre eles, esta ternura: um rapazinho que talvez nem tivesse dez anos, com uma cabeleira despenteada como Beethoven, dançando com o seu violoncelo a música que tocava.
Saímos da Filarmonia encantados, e ninguém sentiu a falta de Sir Simon Rattle.
No próximo ano há mais. Mais um ponto a acrescentar ao meu calendário berlinense.
***
Não sei se conte da vergonha que passámos por ter mudado de lugar no intervalo, convencidos que a sala ia ficar vazia já que o Simon Rattle não estava. Malandros! Ninguém se foi embora. Pouco antes de começar a segunda parte quiserem vir reocupar os seus lugares, e nós ali sentados com cara de "o quê? ainda cá está? porque é que não se foi embora?") - e isto nos lugares mais expostos da Filarmonia. Da próxima vez vou de burka, para ninguém reparar em mim.
2 comentários:
Ups.
Quando faço uma dessas até tremo. E no entanto é um óptimo sinal terem todos voltado.
Pois. Os antipáticos.
Estavam a gostar, como eu.
(Mas não tremi. Afinal de contas, fiz o que todos fazem, mas tive um bocadinho de azar. Paciência. Da próxima vez vou de burka.)
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