01 março 2010

a vida interior das máquinas (2)

Em meados de Dezembro passado descobrimos que a partir de 1 de Janeiro o nosso carro não poderia entrar em Berlim, por ser demasiado poluente. Tínhamos quinze dias para comprar outro, e vender o velho ou arranjar algum sítio fora da cidade onde o deixar até ser vendido.
No dia 30 de Dezembro o Joachim meteu-se no comboio e foi a Frankfurt comprar um carro usado(*). No dia seguinte eu meti as nossas tralhas no carro (velho) e segui com os miúdos para o centro da Alemanha, onde íamos festejar a passagem de ano com alguns amigos. Estava combinado que o Joachim viria depois com os miúdos no carro velho até Berlim, o deixaria às portas da cidade, e eu iria a Frankfurt buscar o carro novo, já com todos os papéis tratados.
No primeiro dia do ano decidimos sair para uma caminhada numa floresta da região. Entrámos no carro, o Joachim fez inversão de marcha com uma bela pirueta na neve, e desligou o motor enquanto esperávamos pelos amigos.
Quando estes chegaram, o nosso motor recusou-se a funcionar. Nada.
Chamámos o ADAC, e entrámos de novo na casa para tomar um cafézinho enquanto esperávamos. O reboque veio, nós tirámos tudo o que tínhamos no carro, dissemos-lhe adeus com alguma tristeza, e ficámos a vê-lo desaparecer ao fundo da rua.

Pergunto-me se as máquinas terão uma vida interior secreta.
Este carro, que em oito anos nunca nos falhou, mal comprámos o substituto despediu-se com uma pirueta e uma imensa delicadeza, num sítio onde com todo o conforto pudemos esvaziá-lo, chamar o reboque e tomar café durante a espera.



(*) A quem interessar possa, por andar à procura de um carro usado: um Mercedes classe B, com 7.000 km e 15 meses, por 16.000 euros.
Em Berlim, um carro semelhante custaria 3.000 euros mais. Perguntei no stand em Frankfurt, e disseram-me que não há problema nenhum em vender para Portugal. Excepto o imposto que é preciso pagar para o carro entrar no país...

2 comentários:

Paulo disse...

Donde se conclui que há pessoas com imensa sorte. Em San Francisco a providência pôs o carro a perceber o que o agente da autoridade dizia. Em Berlim, o carro entendeu que tinha chegado a hora de se retirar para poupar encargos aos donos. Os carros em Portugal devem ser menos inteligentes.

Helena Araújo disse...

Ou os carros são menos inteligentes, ou então respeitam menos a autoridade...
;-)