O meu sogro nasceu em 1935.
Quando a cidade onde vivia começou a ser bombardeada (e vejo agora que não perguntei em que ano), a família refugiava-se na cave, com os outros habitantes do prédio (esqueci-me de perguntar se tinham alguma luz). Lembro bem o seu sorriso ao contar que a mãe, uma mulher muito decidida, dizia com a sua voz segura, mais forte que as sirenes e o estrondo das bombas: "a nós não nos vai acontecer nada!" - e ele acreditava, com toda a confiança que um rapazinho põe na sua mãe, e atravessava aquelas noites descansado.
Morreu há uma semana. Repentinamente, ao fim de um dia perfeito, tendo ao seu lado a mulher e o melhor amigo.
Deixou, como todos, muitas histórias inacabadas: agora me vou dando conta de tudo o que não perguntei.
Deixou também muitos exemplos de como uma pessoa simples e sem poder é capaz de tornar o mundo um lugar melhor.
14 comentários:
É verdade, devíamos perguntar mais, devíamos aentar-nos à beira dos mais velhos e ouvir as histórias deles, e maravilhar-nos com o que não imaginávamos que eles fossem.
Lamento a perda do seu sogro, Helena.
Desses exemplos o mundo não fala. Mas a diferença positiva que certas pessoas fazem no seu seio familiar e de amigos é tão grande que se torna abrangente, vai além dos limites da intimidade familiar.
sentidos pêsames, Helena. Para ti e para toda a família.
Um beijo
Gi,
o meu sogro não era velho.
Nunca tinha tempo para se sentar a contar histórias. Andava sempre a preparar mais uma viagem em grupo a uma região histórica francesa, ou um debate sobre não-sei-quê não-sei-onde...
O meu marido passou várias horas a telefonar a pessoas diferentes para dizer que o pai tinha morrido e por isso não podia concluir o projecto. Os projectos.
Em suma: não era um velho "como os outros".
Mas é verdade: é muito enriquecedor gastar tempo para sentar-se junto aos mais idosos a ouvir as suas histórias.
Catarina,
a gente não sabe mesmo as ondas que podem nascer dos nossos gestos. Ainda hoje falei da generosidade de alguém que mal me conhecia e me ofereceu várias horas para me mostrar San Diego. Quando lhe agradeci, respondeu: "faz a outra pessoa o mesmo que te fiz".
MC,
obrigada.
Sim, é verdade, Helena.
Dá se queres receber.
foi também a sensação que tive quando o meu psi morreu ( com 73 anos ): e agora as pergunats que nunca fiz já mnão as posso fazer.
Como que a dizer-me porque não as fiz ?
Desejo que saiba ultrapassar este momento de dor, Helena.
errata :
onde se lê "psi" deve ler-se "pai"
Ainda bem que corrigiu, António.
Estava eu aqui a pensar "muito nos conta..." ;-)
É, também pensei isso em relação ao meu pai. Todas as coisas em que a gente não pensa enquanto estamos todos vivos, e de repente falta-nos um elo e com ele algumas peças da nossa própria história.
Helena, no meu comentário não chamei velho ao seu sogro, apenas mais velho.
Aqui ficam os meus sentimentos e o sinal de eu ainda não morri. Vou tentar postar um texto sobre a Páscoa.
Até breve.
Gi,
nem que tivesse chamado velho, isso não era problema!
O curioso é eu descobrir que não o achava velho. Nem sequer mais velho.
Porque haveria? Cheio de saúde, e extremamente activo. Era "um dos meus".
Manuel António,
mas que bela surpresa!
Sim, por favor, publica o teu texto!
Eu vou sair na quinta-feira da Semana Santa, e volto dez dias depois.
Podemos combinar que manténs tu os serviços mínimos, e apreoveitas para elevar o nível?
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