03 julho 2009

conversa no cabeleireiro

Ontem deu-me uma urgência de ir cortar o cabelo.

O cabeleireiro onde costumo ir não tinha tempo, de modo que fui a um que fica dois andares abaixo e custa 10 euros menos, e lá tinham tempo, sim, e quase aposto que sei porquê: a cabeleireira disponível estava com uma blusa sem mangas, que deixava à vista não a pele (não se via, garanto que nem um nano milímetro de pele se lhe via) mas uma incrível profusão de tatuagens.

Disse-lhe ao que ia, e ela começou a fazer. Enquanto isso, eu ia lendo numa Stern um artigo sobre o ambiente nas escolas onde juntam todos os alunos que têm mau rendimento escolar. Já falei aqui sobre isso várias vezes: ao fim dos primeiros 4 ou 6 anos de escolaridade, na maior parte das Laender, os alunos alemães são divididos entre os muito bons, que vão para o "liceu", os médios, que vão para uma escola menos exigente e podem eventualmente conseguir o diploma de secundário que lhes permitirá aceder à universidade, e os fraquinhos. Imaginem uma turma de 30 alunos a quem disseram, aos 10 anos, que nunca hão-de ser ninguém na vida...
O artigo retratava uma situação terrível. A violência gratuita, o profundo desinteresse, a falta de perspectivas que começa já em casa (o costume: pais alcoólicos e/ou com depressão, incapazes de dar aos filhos um ambiente familiar saudável), os professores a fazerem contas de cabeça ansiando pelo dia em que aquele aluno for finalmente metido numa casa de correcção...

A cabeleireira, com o seu cabelo lilás e os seus braços encartoonados, começou a comentar: "eu é que não queria ser professora dessa gente! e a minha mãe até me disse que, se tivesse de ser professora numa escola assim, levava uma pistola para a sala, pousava-a na sua secretária, posto isto vamos à matéria de hoje e ai de quem se atreva a perturbar a aula, diria ela."
Respondi: "Não é grande ideia meterem todos os alunos com problemas numa turma só, é quase como pedirem para eles darem ainda mais problemas"
E ela, que teria vinte e poucos anos: "Sim, é verdade, mas não é só isso. Isto é outra geração. No meu tempo também fazíamos das nossas, mas não era assim. Nem pensar em pôr em causa a autoridade do professor! Nas costas deles, dizíamos e fazíamos o que queríamos. Mas na sala, conhecíamos bem os limites."

É o que vos digo: quem vê braços não vê corações.

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