16 julho 2007

cut & paste

Fez agora 70 anos que chegou a Buchenwald o primeiro grupo de prisioneiros.

O campo de concentração começou por se chamar Ettersberg, nome que foi rapidamente mudado devido aos protestos de uma sociedade literária de Weimar, lembrando que Ettersberg está muito ligado a Goethe e a páginas importantes da literatura alemã. Da sorte dos prisioneiros nada se dizia na carta de protesto.
Será um caso de vão-se os dedos mas fiquem os anéis.

Este ano, os discursos foram peremptórios: durante muito tempo pensámos que Buchenwald era um momento irrepetível da História, mas o movimento neonazi está a ganhar cada vez mais força. É fundamental proibir a NPD e lutar com decisão contra o renascer do fascismo.

(Exagero? Enquanto estes discursos estavam a ser proferidos, um grupo de neonazis apareceu numa praia do leste da Alemanha e começou a provocar alguns dos banhistas, sobretudo alemães retornados da Rússia. Largavam tiradas xenófobas, e dispararam tiros para o ar.)



Os sobreviventes parecem cada vez mais cansados e tristes - razão tinha o Jorge Semprun ao lembrar, há 2 anos, que daqui a uma década todos os sobreviventes estarão mortos. E que cabe a nós manter a memória.

Perguntaram a um deles o que sente quando visita Buchenwald. Respondeu que é difícil andar pelo campo de concentração porque se lembra dos muitos horrores que aqui passou, e nem tem palavras para os descrever. Disse que começa a duvidar de que tudo isso tenha acontecido.



Depois revelou a sua preocupação em relação ao renascimento da extrema-direita. Na Rússia, disse ele, já há muitos grupos que se reúnem para festejar o 20 de Abril, aniversário do Führer.

À saída, tivemos de abrandar o passo porque à nossa frente duas velhinhas caminhavam vagarosamente, de braço dado.
Alguém apontou para elas e revelou: a da direita veio para aqui de Auschwitz e Bergen-Belsen, a da esquerda veio de Theresienstadt.
Estranho assombro, quase vergonha, e querer falar com elas - mas dizer o quê?




O campo foi fechado pelos americanos em Abril de 1945. Oito anos, sessenta mil mortos.
Como a população de Weimar se fazia de novas, e que não, não tinha dado conta de nada, obrigaram os burgueses a subir à colina para enterrar os corpos.
Seis semanas mais tarde a Turíngia entrou no pacote que os russos receberam para abrir mão de parte de Berlim, e o campo foi reaberto pouco depois, para meter os "fascistas". Entre aspas, porque os processos eram muito aleatórios.
A população de Weimar continuou a não se dar conta do que ali se passava, até que, alguns anos mais tarde, Thomas Mann veio visitar a cidade e ousou perguntar o que estava a acontecer em Ettersberg. Fecharam o campo, e reabriram-no como museu - para lembrar o horror do tempo do fascismo...
Só depois da reunificação houve a coragem de lembrar que os russos fizeram nesse lugar o mesmo que os nazis.

"As pessoas morriam de medo de falar do campo russo", contou-me uma amiga. "Os avós contavam aos netos, muito em segredo. Mas os pais faziam questão de ignorar. Não se podia saber, era muito perigoso."

Aqui, há cinquenta, há vinte anos.

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