A minha avó era #lavradeira. Não mulher de lavrador, mas herdeira da lavradores. Na aldeia dela, era dos que mais tinha em campos, hortas, bouças, animais. Aos oitenta anos geria a sua casa, os jornaleiros, as terras, o dinheiro (que nunca chegava). Não chegava, por exemplo, para lermos na cama à noite porque estávamos "a queimar luz", e era muito cara. Não chegava para o gás do fogão, que o irmão, o nosso tio americano, lhe tinha oferecido.
Mas chegava para ter fanecas fresquinhas para o almoço dos jornaleiros, belas postas de bacalhau, e aquela deliciosa sopa de lavrador, com feijão e couves, feita no pote da lareira.
E também chegava para a generosidade: em dia de matança de porco, os melhores pedaços do bicho eram distribuídos pelos vizinhos pobres.
Já nos esquecemos de como Portugal era pobre há cinquenta anos: quando a mulher mais rica da aldeia não tinha dinheiro para electricidade e gás.
Em vias de esquecimento parece estar também a decência daquela espécie de contrato social de poupar no seu próprio conforto para poder dar mais a quem mais precisava.
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