Aconteceu em Berlim:
Um homem fala ao telemóvel numa língua que parece russo.
Outro homem faz-lhe um gesto obsceno.
O primeiro homem (em dialecto berlinense): "Oh pá! Se eu tivesse atacado Kyiv ontem não estava agora aqui em Gesundbrunnen. Além disso, isto é polaco!" - e continuou o telefonema.
Leio que os supermercados estão a tirar produtos russos dos supermercados. Ai! Devia ter açambarcado os meus ricos pelmeni antes de 23 de Fevereiro...
Mas - descobri ontem - no meu supermercado ainda há. Os pelmeni russos estão ao lado dos vareniki ucranianos e dos manti turcos.
De facto, são feitos pela mesma firma. Que pertence a um russo que em 1995 fugiu ao ambiente sórdido de São Petersburgo para se instalar na Alemanha, e produz especialidades culinárias da Europa de Leste e da Ásia na mui alemã cidade de Rostock, onde assegura muitas dezenas de postos de trabalho.
(Se calhar tiravam das prateleiras dos supermercados os produtos do país do Putin, e deixavam os do país do Tolstoy, do Tchaikowsky, do Tarkowsky...) (Sugestão de jogo: nomes de russos que enriqueceram a nossa cultura e começam por A, e por B, e por C...)
Querem mudar o nome do "Zupfkuchen russo" para "Zupfkuchen". Esta tem muita graça, porque esse bolo nunca foi russo, e já há anos, quando falei dele e publiquei aqui uma receita, tirei-lhe automaticamente o russo para não enganar ninguém.
Entretanto, em São Petersburgo, a velhinha Elena Osipova estava a manifestar-se contra a guerra e foi levada pela polícia. Com delicadeza, reconheço. Mas mesmo assim...
Elena Osipova é uma sobrevivente do bloqueio nazi à então Leninegrado, um cerco que durou 28 meses com o objectivo de matar de fome deliberadamente a população da cidade, e no qual morreram mais de um milhão de pessoas.
Escrever cem vezes:
- Não são os russos, é o Putin.
2 comentários:
Tens razão, Helena, é uma tristeza, tudo isto.
Em Lisboa, o restaurante russo "Tapadinha", o primeiro de comida russa a abrir em Portugal, está às moscas desde há uma semana, pondo em risco não só a sobrevivência do mesmo, como o futuro dos seus donos, portuguesíssimos de Alcântara, e sobretudo dos seus dois bravos Cozinheiros, um simpático casal ucranianíssimo e que já lá trabalha desde a abertura deste espaço, há mais de vinte e cinco anos!
E muito poucos sabem o que sofrem todas essas Olgas e Ivans, diariamente, para manter não só a sanidade mental, como as suas próprias vidas, como é o caso do Navalny e do último Prémio Nobel, cujo jornal moscovita, o Nova Gazeta, desde há oito dias passou a ter uma edição bilingue, em Russo e em Ucraniano, para demonstrar que na Rússia ainda há muita gente que não endoideceu, nem se deixa iludir pelo louco perigoso que já herdou para sempre o epíteto de novo hitler, pelo menos no domínio da História da guerra e da Diplomacia...
Que gente corajosa!
E se calhar quem quer "cancelar" os russos em Portugal, só por serem russos, podia primeiro perguntar-lhes porque saíram do seu país. Talvez tivessem algumas surpresas - como isso que contas aí: não há um único russo nesse restaurante.
Enviar um comentário