21 dezembro 2021

Gabriel Boric - o "Scholz do Chile"

 

(Foto: Martin Bernetti/AFP - aqui)


Amigos portugueses dizem-me que a comunicação social portuguesa está a tratar a eleição de #Gabriel_Boric como se se tratasse de um perigosíssimo radical de esquerda - o que me lembrou imediatamente um título do Süddeutsche Zeitung que me chamou a atenção: "Boric é tão radical como Scholz" (o novo chanceler alemão).
Traduzo esse artigo (muito à pressa) porque põe as coisas em perspectiva_

Tão radical como Scholz

20 de Dezembro de 2021, 16:37

O novo presidente Gabriel Boric não é o extremista que fizeram crer na campanha eleitoral – é antes uma esperança para os seus compatriotas que sofrem devido ao neoliberalismo.

Comentário de Benedikt Peters

Houve muita gritaria antes das eleições. Este jovem era um radical, um comunista, um extremista; não podia tornar-se presidente. No entanto, nem com estas campanhas de difamação conseguiram impedir que tal acontecesse. Gabriel Boric, 35 anos, barba, tatuagens nos braços, entrará no palácio presidencial do Chile na próxima Primavera. Será o chefe de Estado mais jovem da história do país - e o primeiro decididamente de esquerda a ocupar o cargo desde Salvador Allende.
O mundo não precisa de temer que o Chile esteja a deslizar para uma ditadura comunista. Em termos de conteúdo político, Gabriel Boric é quase tão radical como Olaf Scholz. Escolas e universidades gratuitas, reformas adequadas, bons cuidados de saúde para todos - o Chanceler assinaria tudo isto, como é óbvio. E se não estivesse no governo com o FDP, Scholz, de acordo com as suas promessas da campanha eleitoral, teria aumentado moderadamente os impostos para os mais ricos; Boric quer sobrecarregar um pouco mais os 1,5% de chilenos de topo e as empresas mineiras.
O programa de Boric é radical apenas no sentido literal: ele quer chegar à raiz do sistema chileno. O neoliberalismo que o ditador Augusto Pinochet outrora impôs ao país deve ceder - e com ele a gritante desigualdade social que ainda hoje agita o Chile.
O que esta eleição também significa: o campo Pinochet perdeu
Gabriel Boric tem vindo a trabalhar na mudança há mais de dez anos. Como porta-voz dos estudantes, liderou os protestos de 2011, quando centenas de milhares saíram para as ruas em busca de mais justiça. Esteve novamente entre os líderes nas grandes manifestações de 2019. Nessa altura, o governo abriu o caminho para uma nova constituição mais justa, que está actualmente a ser elaborada. A eleição de Boric confirma agora o que se tinha tornado evidente em 2019: as exigências dos jovens chilenos passaram da rua para a política.
A eleição de Boric é motivo de celebração, quanto mais não seja porque significa que José Antonio Kast não se tornará presidente. O candidato derrotado é profundamente conservador. Kast glorifica a ditadura de Pinochet, queria proibir em grande medida os abortos, facilitar o direito de porte de armas e mandar cavar uma enorme vala na fronteira norte do país para barrar o caminho aos migrantes venezuelanos. No entanto, 44% dos eleitores votaram no domingo a favor do "Bolsonaro chileno", como alguns meios de comunicação social lhe chamaram apropriadamente.
Estes 44% são o maior desafio para o novo presidente. Entre eles estão não só os xenófobos e os super-ricos, mas também muitos chilenos que anseiam por segurança. Estão preocupados com os problemas crescentes com os bandos de droga, devido ao conflito não resolvido com os povos indígenas Mapuche no Sul, ou também porque o processo constitucional de 2019 está simplesmente a avançar demasiado depressa para eles. Um processo marcado por jovens esquerdistas que falam sem dificuldade várias línguas e têm preocupações de género.
Boric deve agora mostrar que também pode oferecer algo aos seus críticos. Deve reduzir a criminalidade e implementar as reformas sociais anunciadas sem asfixiar a economia. Os seus ombros de 35 anos estão sobrecarregados com tarefas pesadas - e as esperanças da sua geração.


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