30 agosto 2021

de volta ao gineceu

O Vasco Barreto (logo ele!, hehehe) foi acusado de machismo estrutural por se propor a conversar com mulheres sobre o estilo da indumentária de uma ministra, e foi assim que fiquei a saber que esse tema está vedado aos homens. É pena: vou ter de combinar com ele tomarmos um café na clandestinidade para podermos trocar ideias sobre, por exemplo, a diferença de estilos de vestuário de uma Angela Merkel e uma Christine Lagarde. É certo que já debati esse tema no facebook, e na altura participaram homens e mulheres. Mas isso foi há uns anos. Em 2021 já não se pode. A não ser - se bem entendi o que lhe disseram no twitter - que os homens participantes na conversa tenham o cuidado de discutir previamente o que algum político (homem) vestiu. Só assim conseguem um visto que os autorize a conversar sobre estilos de roupa de uma mulher. 

A culpa disto tudo, em minha opinião, é dos raixparta dos homens da política, que podiam ousar um pouco mais, para haver o que dizer sobre o que vestem, em vez de assentarmos todas as baterias nas mulheres. Mas não: andam sempre com aqueles fatos escuros, aquelas camisas brancas, aquelas gravatas azuis (nos dias normais) e vermelhas (na campanha eleitoral). Excepto o assessor da Joacine, abençoadinho!, que escolheu uma toilette bastante feiosa para o seu primeiro dia no Parlamento, e assim nos ofereceu abnegadamente vários dias de discussão: saia plissada, camisa fechada até ao gasganete, pffff! 
(O apicultor que volta e meia vem cá resolver problemas com as nossas abelhas tem uns vestidos bem mais engraçados que aquilo.) (Vasco, falaste sobre a roupa do assessor da Joacine nessa altura? Se calhar ainda não prescreveu, e assim já ficavas autorizado a falar agora sobre a roupa daquela deputada.)

Este incidente lembra-me um outro, que aconteceu no início da plataforma Capazes, quando ainda se chamavam "Maria Capaz". Um dos homens que participavam no grupo foi tão mal tratado que às tantas perguntou se aquela era uma plataforma feminista ou uma plataforma feminina. E é aí que vejo o maior problema deste tipo de feminismo: ao pôr uma placa de "menino não entra" em certos temas, estamos a deslocar esse assunto para dentro de um gineceu - e nós com ele. O que é, obviamente, um empobrecimento. 

Além disso, é difícil explicar aos homens - que queiramos ou não perfazem cerca de 50% da nossa sociedade - porque é que têm de aceitar a mordaça que algumas pessoas lhes querem impor. Corre-se o risco de uns largarem em gargalhadas trocistas e outros - os que podiam ser aliados importantes na luta feminista - encolherem os ombros enquanto cantarolam:

 "vão sem mim que eu vou lá ter". 


8 comentários:

Jaime Santos disse...

Parece que o problema é que pelos vistos não deixam sequer que lá vamos ter...

E já agora, uma pergunta machista. Mas quem é o xoninhas que anda a perder tempo a discutir indumentárias (seja de quem for)?

Isso é conversa de gajas :) ...

Gajo que se preze tem um armário cheio de roupa toda igual para não ter que perder tempo a decidir o que vai vestir...

Por isso é que os colegas da Merkel e da Lagarde andam sempre de fato escuro, capiche?

Helena Araújo disse...

Claro que essas fanáticas querem que os homens vão lá ter - mas é bem presos pela coleira e com a trela curta e bem apertada pelas mãos delas.
É isto que me incomoda nesse tipo de feministas: falam dos homens como se fossem todos monstros.
Sim, há machismo estrutural. Mas daí a achar que se pode impedir um homem de perguntar "isto é vestir bem?" porque isso é sinal de machismo estrutural vai um pequeno salto quântico.

A roupa não tem de ser sempre igual. Penso que a farda de trabalho da Merkel também não lhe rouba muito tempo para escolher. :)

Jaime Santos disse...

Como é mesmo aquela afirmação cínica, o sonho dos escravos não é serem livres, é tornarem-se senhores?

Mas parece tudo tão fútil, arranjar uma guerra por um motivo tão corriqueiro... Claro que um homem pode opinar sobre a indumentária de uma mulher, não é isso que os jornalistas de moda fazem há décadas?

Isso objetifica uma mulher? Porventura, mas os homens também são há muito objetificados e depois, representa isso uma degradação da pessoa? Não necessariamente, ou então teríamos que banir a profissão de modelo...

Quanto a Merkel, tem toda a razão e eu avanço uma possível explicação. Tal como eu, a senhora é Física e posso garantir-lhe que a classe (eu incluído), homens e mulheres, liga pouco ao vestuário, passamos mais tempo entretidos com elocubrações sobre como funciona o Mundo em que vivemos :) ...

Isso tem a vantagem acrescida de que assim ninguém nos poderá acusar de objetificar quem quer que seja :) ...

Helena Araújo disse...

Penso que neste caso concreto o problema é estar a falar-se da roupa de uma ministra, em vez da de um designer apresentada por um modelo. Mas só por meio de julgamentos de intenção é que passam para a intenção de menorizar a ministra.
Também me parece mal que se fale da roupa ou do corpo de uma mulher com a intenção de a atacar, nomeadamente na sua actividade profissional.
Mas proibir os homens de falar sobre estilos de vestuário feminino é um exagero.

Jaime Santos disse...

Ora, se alguém ataca uma mulher ou um homem pela maneira como se veste, no contexto profissional, isso revela apenas que não parece ter muito mais por onde os atacar.

Isto dito, no contexto de certas profissões e nomeadamente de políticos em exercício, homens ou mulheres, devo dizer que sou adepto de um certo conservadorismo no vestir, porque essas pessoas representam o Estado. Ninguém iria conceber que Lagarde ou Merkel (ou os seus colegas homens) fossem trabalhar de fato-macaco...

Aliás, por essa mesma razão é que juízes e outros magistrados, polícias, etc, usam farda (ou toga, o que vai dar ao mesmo). Elas são símbolos da igualdade entre os diferentes membros de uma instituição, mas também projetam uma dada imagem dessa mesma instituição.

E se alguém se desleixa nesse exercício, pode ser criticado por esse desleixo. Confesso que me chateia que os deputados do BE, nas audiências com o PR, não usem gravata. O Jerónimo de Sousa, no seu trabalho de deputado na AR também não a usa, mas quando se dirige a Belém não se esquece dela (e convenhamos, o fato e a gravata favorecem-no muito, porque ele está muito envelhecido).

O estilo casual-chique à Varoufakis-Tsipras é pretensioso e revela falta de respeito pelos interlocutores...

E para a próxima, já sei que tenho autoridade para criticar a Catarina Martins pelas suas indumentárias ;) ...

Helena Araújo disse...

hahaha

Estava a lembrar-me do Joschka Fischer que no Parlamento andava de camisolas tricotadas à mão e sapatilhas, mas no seu primeiro dia como MNE foi visitar a Polónia com um fato de colete, sapatos de verniz, tudo como manda o figurino.

E o Gilberto Gil, ministro da Cultura, que foi visitar uma tribo na Amazónia vestido de fato e gravada, porque estava a fazer uma visita oficial como membro do governo.

A questão é que os homens têm uma farda de trabalho (fato e gravata) mas as mulheres não. Há quem critique o fato de trabalho da Merkel por ser pouco feminino...
Seja o que for que uma mulher vista, alguém vai ter algo que dizer. E diz.

Jaime Santos disse...

O Joschka é um gajo porreiro. Também foi por causa dele que da única vez que votei na Alemanha nas Europeias, dei o voto ao seu Partido...

Sim, isso é verdade. Eu acho que a Merkel veste como veste (de forma tremendamente conservadora, faz lembrar os filmes da RDA) porque a Merkel é como é. Que é como as pessoas se devem vestir...

E depois não ofende ninguém e isso é mais do que suficiente.

Não é propriamente o assessor da Joacine. E antes que me chame reacionário, não, não era a saia, era a total falta de gosto...

Ou se calhar sou eu que tenho gostos reacionários ;) ...

Helena Araújo disse...

Sobre os gostos reaccionários: eu não queria dizer nada, mas... ;)