30 março 2021

covid party



Começo a suspeitar que o meu nudista só aparece nas manhãs dos dias ímpares. Ao quinto dia, lá estava de novo a limpar o chão junto às margens. Desta vez sem calções (ou seja: literalmente nudista), mas fiz de conta que não vi, e não fotografei.
(Felizes os que acreditam sem ver.)

No passeio da tarde tive de me desviar de um grupo de jovens que vinham a sair do caminho que tomo habitualmente para chegar ao lago. Um dos rapazes estava tão embriagado que nem se aguentava nas pernas. As raparigas - sempre as raparigas - ajudaram-no a pousar no passeio.

Atrás desses havia um grupo ainda maior, parado numa parte mais larga do caminho. Covid party? Mudei a minha rota para não ter de me cruzar com eles. Embora, pensando bem, provavelmente houvesse pouco risco: com a quantidade de vapor de álcool que saía daquelas bocas, o ar devia estar muito bem desinfectado...

O tempo estava feioso. Num tronco sobre a água, encontrei dois patos à espera de dias melhores: um caso de pato escondido com a sombra de fora.

Também encontrei o marido daquela vizinha que no dia anterior me tinha contado a história interminável. Vinha com o cão, e parou para meter conversa com três miúdas que estavam sentadas na relva. Pensei "então que é isto?!" mas depois reparei que uma delas era a sua filha. 

Disse-me que era uma festa de finalistas do liceu. Estava a decorrer a semana temática (bem me lembro quando no dia dos "cartoons" a minha filha foi de metro para a escola com o cabelo armado como se fosse a Marge Simpson), e nesse dia o tema era "red light/blue light". Os rapazes vinham vestidos de chulo, as raparigas vinham despidas de prostituta, e pelos vistos estavam a beber o mais que podiam para atrair a luz azul da ambulância. Embora o mais provável fosse atraírem a luz azul do carro da polícia, dado que estavam em flagrante desrespeito pelas regras de contenção da pandemia.

Também não fotografei - porque os adolescentes têm o direito de asnear sem deixar registo fotográfico que os envergonhe nos setenta anos subsequentes. E a tolerância em relação aos adolescentes finalistas de 2020 e 2021 tem de ser ainda maior, uma vez que este grupo etário está a pagar um preço altíssimo para proteger a saúde de todos nós. Embora tivesse sido simpático da parte deles se andassem de máscara...
("lembram-se na semana dos finalistas, quando bebemos cervejas com palhinhas por baixo das máscaras?" / "hahahahaha" / "hehehehe" / "palhinhas?! isso deixou de existir pouco depois"

A polícia não veio. Bem vistas as coisas, não há motivo para perseguir filhos de boas famílias em Charlottenburg quando toda a gente sabe que o problema são as covid parties que têm lugar nos bairros de imigrantes turcos e árabes...

Para evitar o ajuntamento no meio do caminho subimos umas escadas feitas de troncos na encosta abrupta. O meu vizinho - que tem a minha idade - tropeçou duas vezes. Disse que era por serem degraus irregulares, mas eu fiquei a pensar se não será também consequência da covid que teve há um ano. Ainda não recuperou o olfacto e o paladar, e pergunto-me se a doença não terá afectado também a sua capacidade de reagir rapidamente a situações inesperadas, como por exemplo degraus de alturas diferentes.  

Ao passar por um talhão cheio de silvas no meio das casas vendidas por vários milhões (devem estar à espera que o valor do terreno duplique) (e não vão ter de esperar muito) apontou para o meio da vegetação, onde - segundo consta - há um covil de raposas. E mostrou-me um pintarroxo sentado num ramo em primaverança feliz. O passarinho desapareceu logo que tirei a primeira fotografia. Com tamanha velocidade de reacção, este não deve ter tido covid. 


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