O ensaio geral correu tão mal que nos pôs em estado de alerta extremo. Foi o melhor que nos podia ter acontecido.
(Enfim, o segundo melhor. O primeiro melhor teria sido sabermos todos a partitura de cor, estarmos bem ligados a todas as vozes do nosso naipe, não tirar os olhos do maestro.) (Ah, e ter uma boa acústica, que uma boa acústica dá sempre jeito, e naquela igreja não conseguíamos ouvir as pessoas da fila da frente nem da fila de trás.)
Depois do ensaio desastroso, ficamos em modo alerta total. À frente do nosso público, numa casa cheia a rebentar pelas costuras, demos tudo. Simultaneamente tensos e calmos. E foi assim que no dia 24 de Novembro de 2019 inventei uma nova lei da Física - a Lei da Relatividade Música-Tempo: quando a música corre bem, o concerto conclui-se muito mais depressa. Ontem, não me durou nem cinco minutos, e cheguei à última página em luto antecipado por termos chegado ao fim. Se me deixassem mandar, inventava concertos destes em repeat. Enquanto estivesse a correr bem, ninguém parava.
(Não liguem a esta proposta, esqueçam. Era falar por falar. Mesmo antes de pôr o ponto final parágrafo já me tinha ocorrido que seria uma espécie de priapismo, e dizem que é doloroso. Esqueçam.)
Resumindo e concluindo: às vezes vejo os filarmónicos de Berlim a sair de um concerto, e trazem um brilho diferente nos olhos. O melhor do meu requiem de Mozart de ontem foi descobrir em mim o que existe por trás e por dentro desse brilho.
2 comentários:
Parabéns! E não há uma gravação para partilhar??
Lucy, acho que o mundo não precisa de mais uma gravação deste requiem... :)
E nós não temos dinheiro para pagar a quem nos faça uma gravação com a qualidade das profissionais. Quer dizer: o mundo não precisa mesmo nada de uma gravação de má qualidade deste requiem.
De qualquer modo, o melhor de tudo foi mesmo o brilho nos nossos olhos.
Se arranjar uma fotografia, mostro-te. :)
Enviar um comentário