12 outubro 2019

ah, é apenas a minha opinião, e tenho direito a ela...

Amanhã vai haver uma marcha em Berlim contra o anti-semitismo e o racismo.
Muito simbolicamente começa na Bebelplatz: a praça no centro de Berlim - entre a universidade, a biblioteca, a ópera e a catedral católica - onde os nazis queimaram os livros em 1933.

Alguns dirão: pois, lá está - queixam-se da fogueira de livros dos nazis, mas querem fazer o mesmo. Querem impedir os outros de dizer o que pensam.

Quem assim fala ainda não percebeu que não se trata de uma questão de simetria. "Racismo" e "respeito pelo ser humano" não são opiniões de valor igual e que merecem igual respeito. Não é uma questão de concordar em discordar, e muito menos de tentar encontrar um consenso - trata-se de respeitar valores básicos para a coexistência pacífica entre todos.

Lembram-se do Walter Lübcke, o político que foi assassinado este ano?
Eis a história completa (pode-se ler mais aqui e aqui, em alemão): em 2015, na altura em que os refugiados sírios entravam no país aos milhares por dia, foi necessário criar rapidamente centros de acolhimento para todas essas pessoas. Em cada região foram identificados edifícios devolutos que pudessem ser usados para esse fim, e fizeram-se sessões de esclarecimento com os cidadãos. Numa dessas sessões, no dia 14.10.2015, Walter Lübcke tentava explicar às pessoas o que ia ser feito, mas o seu trabalho estava a ser muito dificultado por agitadores de extrema-direita que se tinham espalhado por toda a sala, que o interrompiam gritando "Estado de merda" e "governo de merda" e atiravam perguntas provocatórias e polémicas. A certo momento, Walter Lübcke louvou o trabalho das escolas, do voluntariado e das instituições que trabalham em conjunto para transmitir os valores essenciais desta sociedade, disse que dá gosto viver num país que se identifica com eles, e - irritado com os gritos e as provocações - rematou: "e quem não defende estes valores, está à vontade para se ir embora do país se não concordar".
O vídeo deu a volta pela internet com títulos como "ser alemão não é crime".
Quatro dias depois festejava-se em Dresden o primeiro aniversário da Pegida, e um dos oradores comentou, a propósito deste incidente, que haveria com certeza outras maneiras de tratar os alemães que não concordam com a política de integração, mas infelizmente os campos de concentração estavam momentaneamente fora de serviço. Mais tarde foi obrigado a pagar uma multa por discurso de ódio.
Entretanto, um vídeo manipulado (onde se ouve esta frase sem o contexto provocatório em que ocorreu) multiplicava-se pela internet, acompanhado por inúmeros comentários violentos. O blogue  "Politicaly Incorrect" publicou a morada, o número de telefone e o endereço de e-mail de Walter Lübcke. Ao longo dos anos seguintes, políticos de extrema-direita divulgaram este vídeo repetidamente numa estratégia de auto vitimização. Até que no dia 2 de Junho de 2019 um homem se dirigiu à casa de Walter Lübcke e o matou com um tiro. Era o homem que no fim deste vídeo se ouve a gritar "Verschwinde!) ("desaparece!")
A notícia do assassinato do político foi acolhida em certas partes da internet com comentários de júbilo: "uma ratazana nojenta a menos!", "agora só faltam os outros todos", "a guerra ainda mal começou".




Aqui está o comunicado do convite para a manifestação de amanhã em Berlim, em inglês. Sublinhados meus.



#KeinFussbreit (= não ceder)

Antisemitism and racism kill. Right wing terrorism is threatening our society.

The right-wing terrorist attack in Halle leaves us stunned and makes us angry. We commemorate the victims. Our thoughts turn to all members of the Jewish community, all affected people, relatives of the victims in and around the snack bar and at the further targets of the attack, as well as to all those who have long since ceased to feel safe.

Two people were killed in the terrorist attack. The members of the Jewish community have only just escaped a massacre. By now it is evident, that the perpetrator acted based on antisemitic and racist motives. He may have committed the crime alone, he is therefore not a lone perpetrator - the crime stands in the following context:

Jews, Muslims, People of Colour and all those who don’t fit into the inhuman conception of the world of the (extreme) Right, can no longer feel safe and secure
• More than 200 people have been killed by right-wing violence since 1990 in Germany
• Consolidated militant Nazi structures, the NSU network and right-wing networks in German security agencies
• Lack of willingness to elucidate and bring about justice, as recently experienced in the NSU Complex and in other radical right acts of violence
An unceasing trivialisation of the right-wing danger and a defamation and obstruction of democratic, civil society and antifascist engagement
and an advancing normalisation of antisemitic, racist and inhuman mindset in parliaments, media and the general public

We view this act as an attack on our society! A society in which we are committed to defend social and human rights and in which all people should be able to live a self-determined life free of fear.

Antisemitism, racism and any form of group-based discrimination are not mere opinions that a democratic society must endure. They lead to inhumanity, humiliation, discrimination and violent crime. We stand united and oppose this resolutely.

In this difficult hour, we stand together in solidarity and above all: indivisible!
We demand a consistent and complete resolution of all right-wing criminal acts of violence!
We call on everyone to show solidarity!
We will not allow ourselves to be played off against each other.
Together we express our grief, anger and compassion. On Sunday, October 13th we will walk from the Bebelplatz in Berlin-Mitte to the New Synagogue in the Oranienburger Straße.

This call was initiated by people, activists and organisations from the #Unteilbar alliance. We invite all people, groups and alliances who are committed to the demands and principles of the call to join us. The demonstration was registered together by #unteilbar and the Jewish Forum for democracy and against antisemitism – JFDA.

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