16 maio 2019

bitter home alabama

O Senado do Alabama aprovou um diploma que proíbe o aborto, mesmo em casos de violação ou incesto. Única excepção: caso a vida da mãe esteja em perigo.
Nesta lei há dois detalhes estratégicos muito manhosos:
1. Ao castigar apenas o médico que fez o aborto, omitindo qualquer punição para a mulher que abortou, consegue reduzir imenso as tensões. Para a maior parte das mulheres, uma gravidez indesejada, uma violação ou um incesto são hipóteses mais ou menos remotas - e há ainda a possibilidade de ir a um Estado vizinho fazer o aborto. Se apenas os médicos são punidos, as mulheres não se sentem realmente ameaçadas, e portanto dificilmente lutarão contra esta lei com urgência e fúria.
2. O objectivo da lei é fazer com que o caso vá até ao Supremo Tribunal, agora dominado por conservadores escolhidos por Trump, de modo a reconsiderar a decisão Roe vs. Wade - e abrir caminho para a proibição do aborto em todo o país.
E assim vamos. Quando as mulheres dos EUA derem por isso, estarão todas elas condenadas a levar uma gravidez até ao fim, independentemente das circunstâncias de cada caso e das perspectivas de futuro de uma criança que não foi desejada. 

Se me deixassem sugerir, era isto que sugeria às mulheres (e aos homens com sentido de decência) do Alabama:

1. Exigir que à lei seja adicionada uma nova cláusula: se a mulher quiser abortar e for impedida por lei, o pai da criança tem de assumir automaticamente todas as consequências da gravidez - despesas decorrentes da gravidez, eventuais perda de salário e/ou emprego, tratamento psicológico para aguentar uma gravidez não desejada e, last but not least, pagar todas as despesas da própria criança até esta chegar à maioridade.
Em nome da igualdade, até concedo que estes custos sejam partilhados de forma igual entre o pai e a mãe (embora seja uma igualdade relativa, porque não considera o esforço e o risco que a gravidez implica para o corpo da mulher).
Já o disse há muitos anos, e continuo a pensar que esta é uma condição básica para as sociedades debaterem sobre o aborto de forma honesta. Se a proibição do aborto implicasse consequências sérias para o bem-estar dos homens, a discussão seria bem diferente. Aliás: provavelmente nem haveria discussão.

2. Greve de todas as mulheres para exigir a inclusão daquela cláusula. Primeiro num domingo, só para dar um pequeno aviso. Depois num dia da semana.
(Imagine-se um Estado no qual todas as mulheres se recusariam a mexer uma palha durante um dia inteiro.)

3. Os médicos que se sentirem ameaçados por esta lei deveriam emigrar - quanto antes, melhor - para outros Estados.
(Até podiam ir para o Reino Unido, que por causa do Brexit vai ter um problema gravíssimo de falta de médicos, mas agora já estou a misturar demasiadas questões.)

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