20 fevereiro 2019

"sois belle et tais-toi!" - Berlinale 2019










Tal como na indústria do cinema em geral, também a Berlinale tem vindo a dar um lugar cada vez mais central às mulheres. Em 2019, a acentuação dessa tendência revelou-se não apenas nos temas dos filmes mas também na secção Retrospectiva, que mostrou o trabalho das realizadoras, desde 1968 até 1999. Por sua vez, o programa de filmes de arquivo da secção Forum mostrou dois filmes de Delphine Seyrig sobre o papel que as inovações técnicas na área do vídeo tiveram na documentação do movimento feminista, e um exemplo das nossas possibilidades, concretizado no filme "Sois belle et tais-toi!". Trata-se de um documentário feito com meios muito simples (a câmara parada na cara da actriz entrevistada) e perguntas muito inteligentes ("terias escolhido ser actor se tivesses nascido homem?", "alguma vez fizeste uma cena com outra mulher, e, caso afirmativo, estavam numa posição de concorrência ou de confiança?", etc.).

O filme está no arquivo do Centre Audiovisuel Simone de Beauvoir, juntamente com milhares de outros documentos sobre a luta feminista. Nele, o que mais me surpreendeu foi dar-me conta de que já em 1976 se falava destes assuntos, mas foram necessárias décadas para a indústria do cinema começar a mudar.

Deixo três trechos de entrevistas, e acrescento uma ideia transmitida já não sei por qual actriz: nos anos quarenta do século passado o código Hays tinha regras muito rígidas para as cenas de cama nos filmes. As pessoas tinham de estar vestidas, e era obrigatório pelo menos uma delas ter um pé no chão. Essa foi uma época áurea para as actrizes: como não podiam fazer cenas de sexo, a indústria cinematográfica dava-lhes outros papéis e fazia-as aparecer nos filmes como sujeitos actuantes e com interesses próprios. A partir do momento em que a censura às cenas de sexo abrandou, as mulheres passaram a ter cada vez mais um papel subsidiário e de resposta às fantasias masculinas. 

"Sois belle et tais-toi!" foi o último que vi nesta Berlinale 2019. Uma bela maneira de terminar aquele festival.


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