Talvez tenha entendido mal, mas registei algures que o teólogo Karl Rahner terá dito que a ressurreição é a parte "abracadabra" do cristianismo. Ou se calhar fui eu que pensei nisso, e resolvi ir buscar um nome sonante para endossar as minhas palavras, como aqueles poemas cheios de banalidades que povoam o facebook e diz que são do Fernando Pessoa.
A parte da ressurreição pouco me importa. Quando chegar a minha vez, "deixo-me cair nas mãos do Deus vivo"(*), e logo se vê. Para já, interessa-me o sentido que encontro nos meus dias, e o rumo que lhes dou.
(*) Karl Rahner: "para o cristão com fé, a morte é cair nas mãos do Deus vivo".
Ao chegar ao fim da vida, o famoso teólogo respondeu a quem lhe perguntava se estava com medo da morte: "medo? não! apenas uma enorme curiosidade."
(Um teólogo que sente curiosidade perante a morte? Coitadinhos dos dogmas, devem estar todos na urgência do atendimento psicológico.)
Sobre o sentido e o rumo, volto ao meu poema de sempre da Sophia:
Escuto mas não sei
Se o que ouço é silêncio
Ou deus
Escuto sem saber se estou ouvindo
O ressoar das planícies do vazio
Ou a consciência atenta
Que nos confins do universo
Me decifra e fita
Apenas sei que caminho como quem
É olhado amado e conhecido
E por isso em cada gesto ponho
Solenidade e risco
E acrescento frases soltas do Karl Rahner:
* O sermão da montanha só pode ser entendido por quem tiver a coragem de se pôr radicalmente em questão - a si próprio, e não aos outros; e muito mais que questionar apenas uma ou outra coisa em si próprio.
* A maneira menos confortável de avançar é por dentro de si próprio.
* Na oração de súplica há duas coisas: a certeza de sermos ouvidos e a renúncia total ao desejo de sermos ouvidos segundo o nosso plano.
* A Fé é isto: aguentar durante toda uma vida a incapacidade de entender e tocar Deus.
E assim vai a minha fé: em serena atenção aos desafios de conversão no quotidiano. Em confiança, sem certezas matemáticas nem entes mágicos a resolver os meus problemas (como dizia um amigo meu: Deus é bom, mas não é bombeiro). Em busca, sabendo que ficarei sempre aquém de tudo e de mim.
É bom que tenhamos ritos e momentos altos no calendário, como a Páscoa. Por uns dias elevamo-nos nessa festa - e depois a vida continua. A caminhada.
Boa Páscoa.
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