03 julho 2012

correio das ilhas III (6)

Olá, olá,

Escrevo os postais aos pares, tentando correr contra o atraso. Um destes dias talvez consiga contar sobre o S. Pedro no café da minha aldeia, se tiver tempo (este meu stress de alazeres...) - e já foi há tantos dias.

Pouco antes da nossa chegada, as vizinhas vieram arranjar a casa e deixar flores. O Matthias já o disse há muitos anos: se esta vizinha morrer, a nossa casa não vale nada.





Encosto-me a um esteio de granito sob a ramada, e leio. Naguib Mahfouz. O Joachim joga à bola na eira, o Matthias subiu ao telhado de um coberto e faz fotografias da propriedade. Está-se ainda melhor assim, no quintal, que dentro da casa antiga. À minha volta: a eira onde os miúdos jogavam hóquei de vassoura, onde uma Christina desenhava a giz os mapas do seu mundo aos três anos, o espigueiro que o Matthias e o Joachim envernizaram, a tangerineira para sempre ligada à memória do meu pai, os desenhos de diferentes texturas das pedras do muro, das folhas da hera e das hortênsias, um pouco mais longe os jarros que guardamos porque eram flores queridas do meu sogro.
As casas desenham-se por dentro. Sim, por dentro de nós. Mas esta casa não se desenha - grava-se ao ferro e fogo das recordações felizes.

7 comentários:

Cristina Gomes da Silva disse...

Belo texto, Guilena. :-)

Helena Araújo disse...

:)

"As casas desenham-se por dentro" é uma frase que saiu da minha cabeca, ou da pena do Manuel António Pina?
Tentei encontrar na internet, mas nada. E o seu livro de poemas está-me a 3000 km de distancia.

maria disse...

:)

O MAP tem um livro com o título "Como se desenha uma casa".

Boas férias, Helena

Mar* disse...

Ainda ontem, em casa de uns amigos numa encosta do Douro, sentada na varanda, enquanto o luar banhava de prata as memórias felizes que íamos recordando daquelas paredes, daqueles quadros e livros, das gargalhadas de tantos que já nos faltam, pensava baixinho com os meus botões qualquer coisa do género: há "casas (que se)desenham por dentro de nós", sim, e nós desenhamo-nos nelas, numa simbiose perfeita.

Helena Araújo disse...

Maria, era justamente nesse livro que estava a pensar - mas o meu está em Berlim.

Mar, pois: nós desenhamo-nos nelas.

jj.amarante disse...

Parece um ambiente muito agradável. A chaminé ficou de fora?

Helena Araújo disse...

ficou de fora, ficou. Calhou assim, e ainda bem. Continua muito arte contemporanea...