02 janeiro 2012
Taizé em Berlim (7)
Como habitualmente, na festa que se segue à vigília da passagem de ano é pedido aos grupos de cada país que participem com algum programa para a "festa das nações". Quando chamaram os portugueses, eles, que não tinham preparado nada, não se atrapalharam: ali mesmo, à frente do público, começaram a discutir o que iam cantar, e cantavam, e discutiam qual seria a seguinte, e cantavam e dançavam - e o público dançava também e delirava.
As saudades que eu já tinha deste povo assim!
Assim: desenrascado, compensando com alegria e espontaneidade o que falta em organização e disciplina.
As pessoas deste grupo não andavam com cara de depressão e crise. Bem sei que estavam a passar uns dias especiais entre amigos, mas não senti neles o tom pesado que vejo muitas vezes nos textos da internet. Que será que estes têm, que falta nos blogues e no facebook que leio?
Perguntei-lhes, e a resposta veio num tom decidido de esperança: "Então a Alemanha conseguiu levantar-se depois daquela terrível destruição da segunda guerra mundial, e nós não havemos de conseguir recuperar?! É andar para a frente, e fazer o melhor possível a partir daquilo que temos."
Entre eles havia também professores, que falavam da situação difícil da escola, particularmente do problema do trespasse de responsabilidades: os pais não sabem o que fazer aos filhos, ou à sua própria vida, e a escola aparece como o bom-beiro que tenta resolver os problemas e suprir as lacunas - os professores feitos educadores, psicólogos e assistentes sociais. Falavam de tudo isto como um desafio aceite com sentido de responsabilidade e alegria. Se me deixassem mandar, no próximo 10 de Junho distribuía medalhas pelos professores portugueses: porque é deste seu modo de olhar para os alunos como pessoas inteiras e concretas, e desta sua generosa entrega, apesar de todas as imensas dificuldades, que se alimenta a esperança num Portugal capaz de se reinventar.
De todas estas conversas, ficou-me a sensação que partilhámos a última semana de 2011 com uma amostra do que há de mais são em Portugal.
***
Saí da festa pouco depois da uma da manhã, porque queria ir para casa e telefonar à família em Portugal. Percorri o Ku'damm com os seus passeios cobertos de destroços do arraial de foguetes. Tanto dinheiro, tanta poluição, tantos feridos graves por andarem a brincar com fogo e pólvora. Haverá necessidade?
Ao passar por um multibanco, entre duas lojas de luxo, vi que dois sem abrigo se tinham instalado lá dentro para dormir no chão. Junto a um deles espalhava-se um líquido - garrafa entornada? urina?
É relativamente fácil abrir as portas de casa a desconhecidos que trazem uma espécie de carta de recomendação de Taizé. Mas ainda estou longe de conseguir reconhecer Cristo num homem andrajoso que urina no próprio chão onde dorme.
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