29 novembro 2011

palavrões e insultos

Apesar de ter crescido no Porto e estar em contacto frequente com o vernáculo minhoto, quando tenho de traduzir palavrões e insultos fico sempre indecisa. É que estas coisas são muito pessoais, e o que serve para mim pode não servir para os outros. Para além da interpretação subjectiva, há os usos regionais: cada terra tem os seus, ou usa os de todos mas atribui-lhes significados diferentes.
Pior ainda: constou-me que em Lisboa certos palavrões ecoam com uma intensidade que surpreende as gentes do Norte, habituadas a isso e a muito mais. Pelo que deviam traduzir versões diferentes de livros, à semelhança do que fazem para DVDs vistos nos aviões ou fora deles: uma versão mais literal para o país a norte do Mondego, e uma mais eufemística para o seu sul.
Em todo o caso, aqui vai uma rápida moral da história: razão tinha a minha avó, quando nos proibia o uso de palavrões - agora vejo bem o trabalho que se pouparia ao tradutor!

Se esta já é uma questão suficientemente bicuda, imaginem traduzir os palavrões usados por um russo que escreve em alemão. Por exemplo: um "Ziegenbock", um bode. Um insulto que os alemães não usam. Lá vou eu farejar pela internet (como é que os tradutores dantes faziam?) e descubro que "cabra", em russo, significa "pessoa manhosa". Aaaah, já me entendo: sua raposa velha. Alea iacta est, gulp.

Algo me diz que o Sherlock Holmes em novo foi tradutor. Mas depois ganhou juízo, e decidiu usar as suas qualidades de detective para tarefas mais simples.

***

Como é que os tradutores faziam antes de terem internet? Perguntavam ao escritor. Escreviam uma cartinha, bai carta feliz boando, e passadas algumas semanas recebiam a resposta. Pelo menos foi isso que contou o primeiro tradutor de Saramago para alemão, e a resposta que veio uma eternidade depois era "essa palavra não existe, inventei-a eu!"
Dei um pequeno salto no tempo, perguntei ao Kaminer. "Bode", afinal, tinha o sentido de teimoso e caprichoso. Será que a sul do Mondego este bode também é uma mula do cara**o?...
*suspiro*

14 comentários:

cjs disse...

Teimoso e caprichoso?
É um anão talecoiso.

Paulo disse...

Acho que a sul do Mondego é teimoso que nem um burro.

Leonor disse...

Ontem houve Kaminer no Delito e aqui: http://o-meu-pai-e-eu.blogspot.com/2011/11/estou-ler-meine-russischen-nachbarn.html

Helena Araújo disse...

cjs,
hahaha

Paulo,
mas tu traduzirias "bode" para "teimoso que nem um burro"? eu estava a pensar escrever simplesmente "mula".

Leonor,
bela crítica - gostei imenso de ler, e agarrem-me que já estou quase pronta a sair para ir comprar todos os Kaminer na livraria ali da esquina.

Paulo disse...

Não sei. Depende do contexto.

Helena Araújo disse...

É uma discussão. Um chama "fettsack" e "steinbock" ao outro.

Paulo disse...

À partida, e não sabendo o que vem para trás, se o sentido do termo é esse, sim.

Helena Araújo disse...

Nem queiras saber o que bem atrás, Paulo. Aquele Kaminer é um delírio...
;-)

Helena Araújo disse...

Eu não acredito que escrevi "o que bem atrás"!
Eu desconfio que há um espírito (do Porto, claro) por trás do meu teclado.

Também muito gostava de saber quem inventou esta ordem das letras e pôs o v ao lado do b.

Paulo disse...

O b ao lado do v... não se faz! Depois não querem que as pessoas troquem uns pelos outros.

Helena Araújo disse...

Pois! Sobretudo com dedos como os meus, que aprenderam a dançar o malhão traçado no Porto!...

(por acaso os dedos só fazima de conta que tocavam castanholas - e ai, se calhar foi isso: de tanto andarem metidos uns com os outros, agora entortaram um bocadinho...)

sem-se-ver disse...

e quantas vezes em escrevo sem-se-ber?


:D


(teimoso que nem uma mula, teimoso que nem um burro, teimoso que nem um bode. donde: mula parece-me bem.)

beijo de mulata disse...

Tão bom, tão bom, tão bom que só me apetece lincar o blogue todo!

(um) beijo de mulata

Helena Araújo disse...

:-)
Mas que bom beijinho logo pela manhã! E um ganho: fui espreitar o teu blogue, ai, como é que agora faço para sair de lá?