16 julho 2011

correio das ilhas (24)

Olá, Rita

já lá vai o tempo em que eu ficava contente por comprar um polo Lacoste por 5 euros. Aliás, agora estou mais para exigir que me paguem se é para eu fazer publicidade a marcas, e quase morro de embaraço empático quando vejo pessoas brandindo enormes D&G ou LV em uivos de falsete. Por isso - e era aqui que queria chegar - só vou à área dos ciganos na feira de Barcelos para lhes ouvir a música. Belas cantorias. Depois sigo para o quarteirão dos lavradores, e naquelas mulheres de lenço na cabeça, fio de ouro ao pescoço e sulcos fundos no rosto retomo o ambiente da infância na aldeia da avó, lembro o cesto que ela arranjava para a feira de São Roque aos sábados: forrado a panos de linho feitos à mão por alguma antepassada, os ovos delicadamente pousados sobre os feijões. Outros tempos.

Na quinta-feira passada andámos também pelo corredor onde vendiam animais. Os miúdos apaixonaram-se pelos pintainhos que nem 24 horas haviam de ter. Comprámos para a vizinha Matilde (boa desculpa). Cada um podia escolher o seu, e eu escolhi também: um preto. No carro, regressando a casa, trataram de começar o processo de bonding (sobre guardanapos de papel, claro, que eles gostam de animais domésticos mas não são parvos) e baptizaram-nos. Deram àquelas coisinhas fofas e aflitas nomes pomposos como Herbert Bonaparte, Fritz the Emperor, e assim. Eu queria chamar Ovelhanegra ao meu novelinho escuro, mas eles ficaram muito chocados, e preferiram Elsa. Também pode ser: assim como assim, vai acabar arroz de cabidela. E com jeitinho podia alugá-la (-lo?) nas festas de São Bartolomeu do Mar, um euro para cada voltinha à igreja (gosto muito destas manifestações de religiosidade popular, e penso que devem ser incentivadas ou, pelo menos, protegidas. A ver se a Elsa cresce a tempo de participar activamente neste fenómeno cultural).

Os bichinhos estão agora no galinheiro da vizinha, tentando acalmar-se como podem depois das manifestações de ternura de que são vítimas a intervalos regulares. Punha aqui algumas das fotografias que a Christina fez (Herbert Bonaparte contemplando sabe-se lá o quê do alto dos joelhos dela, coisas assim) mas ela desapareceu com a máquina fotográfica e eu estou demasiado em férias para ir tratar de resolver esse assunto. A Matilde diz-me com jeitinho diplomático: "ainda os matam com mimo". Sim, literalmente. Mas eles não percebem: pode lá o amor matar? São muito novos - e espero que não apanhem com a dura realidade pela proa, que eu estou a contar com o the Emperor para uma canjinha das boas.   

7 comentários:

Teresa disse...
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Teresa disse...

It's official. Depois da conclusão odeio-te, Helena.

Calimero, mesmo um bocado batido, era capaz de ser um bom nome para o pintainho preto. For more than one reason.

io disse...

Pode o amor matar? oh-oh ... e não, não estou com sono, nem a mandar-te dormir. Aliás, miúda, os ares lusos fazem-te bem: estás a escrever divinalmente. Belíssimo post.

Rita Maria disse...

Eu nunca fiquei contente por encontrar um polo Lacoste por cinco euros, mas um polo bom por cinco euros, sem marca mesmo...as feiras já nao vendem disso? E lençóis de algodao fabuloso a que só faltavam as bainhas?

A este propósito, correiando das ilhas de volta para ti, acho que nunca te contei a história da minha toalha de lenço dos namorados. Era pequenina, muito bonita, o algodao excelente e só custava dois (2!) euros. O pior veio depois: nao só era demasiado pequena e nao cobria a mesa como depois o poema era sobre ser uma pobretanas (aqui tens este lencinho, nao digas que fui eu que to dei, que como nao tenho dinheiro, ainda dizem que o roubei, ou algo do género e com ainda mais erros ortográficos)... por outro lado, foi merecida a desfeita e eu, claro, ri-me. Mas nunca mais compro motivos dos lenços de Viana sem ler com muita atençao.

Rita Maria disse...

PS: Eu, rapariguinha do campo sazonal (a minha identidade é como os meus amantes) daqui te garanto que se ficares muito caladinha nao há qualquer possibilidade de eles distinguirem os pintaínhos deles entre as galinhas assim lá para o Verao do ano que vem. Mas nao digas nada, que me dói a consciência.

Helena Araújo disse...

io,
:-)
(por acaso estava a falar apenas de pintainhos e excessos de ternura para aqueles nervos frágeis)

Rita,
:-)
e obrigada pela informacäo.

Helena Araújo disse...

Teresa: ai duas vezes!
Ai, porque Calimero é óptimo
e
Ai porque näo contava que um simples canja pudesse ser täo mortal para a amizade!
;-)