11 abril 2011

o dia em que tentei convencer o Joseph Calleja de que ele tinha estado em Lisboa

Se querem saber sobre a Lucia de Lammermoor e o Joseph Calleja, leiam aqui, aqui, aqui e aqui.
Eu direi apenas que é uma ópera muito curtinha. E que o Edgardo é homem de poucas palavras, passa o tempo quase todo calado e mudo. Bem podia ter cantado o triplo ou o quádruplo - e mesmo assim sabia a pouco.

Fui com uma amiga que é advogada, o que é uma grande vantagem porque lê também as letras miudinhas, e assim descobriu que iam dar autógrafos. No final da ópera, depois de nos assegurarmos que eles não voltavam mesmo ao palco, despachámo-nos para a sala onde já várias dezenas de pessoas esperavam. Atrás de nós havia um grupo de malteses eufóricos, mostrando orgulhosos as suas bandeiras de Malta. Foi muito engraçado ver no átrio da Deutsche Oper gente já de alguma idade e muito bem vestida a agitar bandeirinhas de plástico. Quando Joseph Calleja e Elena Mosuc chegaram, o bando de malteses correu em alvoroço para o seu tenor, e de repente nós, que estávamos no meio da fila, vimo-nos no fim. Ora, há males que vêm por bem: como não havia ninguém atrás de nós, pudemos ficar um bocadinho na conversa com os cantores. Durante a espera tentei negociar com a minha amiga, se ela pedia dois autógrafos e eu pedia outros dois, assim ficava com um para mim e podia dar os outros à io e ao Paulo, responsáveis por esta nossa noite em beleza. A minha amiga não tinha coragem,  eu pensei "ai três não peço, também não tenho lata para tanto, paciência, pronto, peço dois e dou ambos" e depois aconteceu tudo muito depressa: enquanto ela fazia fotografias, eu pedi quatro autógrafos, dois para mim e dois para ela, e eles deram, e riram-se das minhas confusões de multiplicação de caderninhos naquela mesa. O Joseph Calleja ainda se riu mais quando eu comecei a gaguejar em inglês que estava ali graças à insistência de amigos meus que ficaram encantados quando o viram em Lisboa, e ele "em Lisboa? só se foi no cinema!", e eu "ia jurar que não - tem a certeza que não cantou em Lisboa?", e ele é encantador, abre a cara e ri-se pelos olhos fora, "tenho a certeza, tenho". E eu, ainda pouco convencida, "adorei o seu Edgardo", e ele "muito obrigado", "eu é que agradeço!"
Eu é que agradeço: ao entusiasmo dos amigos que me levou (posso confessar? um pouco a contragosto) a comprar os bilhetes, e ao distribuidor de prodígios - seja lá quem ele for - que escolheu um homem tão simpático e simples para portador daquela voz impressionante.

17 comentários:

Carla R. disse...

Hé! Hé! Hé! Helena "groupie", com fotos e tudo, gostava de ter assistido a isto.
E o que é que tu recomendas para se ir a contragosto ? Ah, esquece, o Sir, claro. Onde é que eu estava com a cabeça?

Helena Araújo disse...

Eu, groupie? hihihi.
O que recomendo na semana da Páscoa? Isto deve estar cheio de Paixões de Bach. O Sir deve andar por Salzburg. De que é que tu gostas?

Carla R. disse...

Sou uma pessoa de gostos simples,o melhor basta-me ;)
Sera que posso esperar encontrar algo que dificilmente encontrarei em Paris ?

Carla R. disse...

Oh, sou uma pessoa simples, contento-me com o melhor ;)
Poderei esperar algo que dificilmente encontrarei em Paris ?

PS: Achas normal que a palavra do verificador aqui em baixo seja scone ? Juro ! Vou tirar uma foto (se a seguir me sair tomates, vou à bruxa, nunca mais aqui venho e compro aquele telemovel em madeira - era Bach ?)

Helena Araújo disse...

Não me perguntes comparações com Paris, porque não conheço. Ou melhor: só conheço de Paris o ar BCBG, tudo muito certinho, aaah, la civilization! le cotê chic!, e tal.
Em Berlim encontras coisas bem diferentes. Ainda ontem estive no karaoke ao pé do muro. Não percas um dos próximos posts, mas agora com licencinha, lá vou eu outra vez à minha vida sempre atrasada.

Helena Araújo disse...

"scones"?!!!!!!
Algo me diz que não estamos aqui sozinhas...

Carla R. disse...

Corre, corre !
Vou estar atenta.

Paulo disse...

Bendita a hora em que insistimos contigo. O Calleja era lá de se perder! O distribuidor de prodígios foi simpático com ele, concordo. Agora era lembrar-se de o distribuir um bocadinho para estas bandas, para nós lhe perguntarmos: lembra-se do Edgardo de Berlim? e da nossa amiga Helena que ficou encantada? Já tínhamos assunto.

Gi disse...

Brava, Helena! Grande coragem, e amplamente compensada, não?
Aproveitou para perguntar como se pronuncia o nome do moço, uma palavra que parece espanhola num país de fala inglesa? Mentes curiosas gostariam de saber.

E o rapaz tinha razão, vimo-lo no cinema, pois. Mas pode ser que um dia haja um convite para cá vir e ele se lembre, Eh lá, o tal país, e aceite.

Helena Araújo disse...

Isso mesmo: bendita a hora, Paulo.

Gi, não é preciso grande coragem: toda a gente falava com eles, e nós nem sequer tínhamos a pressão de uma fila enorme à espera. Era giro se ele se lembrasse do "tal país" e fosse mesmo. Embora: mais cedo ou mais tarde acaba por ir, não é?
Lisboa não precisa de mim a meter água para ser incluída nas rotas internacionais.

Helena Araújo disse...

Quanto à pronúncia do nome, parece que é Josef Calía.
Ouve-se no final deste vídeo:

http://www.youtube.com/watch?v=dDgMD8Mp_tc&feature=related

E é como tenho ouvido dizer por aqui. Mas eu, o pé a cair-me para o chinelo espanhol, sai-me "Calerra". É que quando me dá para meter água,fico imparável.

Gi disse...

Helena, com os orçamentos que Lisboa tem o mais normal é ficar fora das rotas se não houver um empurrãozinho de uma expatriada simpática.

Obrigada pelo clip e pela sugestão de pronúncia, pois eu também andava a dizer "Calherra" e não me parecia bem.

Helena Araújo disse...

Gi,
Essa da pronúncia é sempre complicada. Às tantas, este "Caleía" é como o "Mesa Veíde" que os americanos dizem porque não sabem pronunciar espanhol...

E por falar em empurrõezitos: disseram-me outro dia que os concertos em Berlim em média são subsidiados em algo como 100 euros por lugar.
Acredito? Admiro-me?
Não sei. Mas também li algures que a cidade pagou 1 milhão de euros para ter uma certa escultura em frente da Neue National Galerie durante 10 anos. É o Broken Obelisk de Barnett Newman, e neste site tem a imagem dele em frente àquele museu:
http://de.wikipedia.org/w/index.php?title=Datei:Barnett_Newman_-_Broken_Obelisk.jpg&filetimestamp=20080501090548

Paulo disse...

Nos próximos tempos acho que não haverá empurrão que lhe possa valer. Vemo-lo no cinema e já gozamos.

(Se é verdade essa história do milhão de euros penso que foi dinheiro muito mal empregado. Então a Galeria não é apenas um dos edifícios mais bonitos de Berlim e da arquitectura do século XX? Para quê pôr-lhe coisas feias à frente?)

Paulo disse...

Mesa veíde?

Helena Araújo disse...

"Mesa veíde" é como os americanos pronunciam "Mesa Verde" (um parque nacional).

Quanto ao Broken Obelisk e a esse museu: à sua volta, e no pátio da cave, há esculturas de gente muito famosa. Essa é uma entre muitas.
Achas feia? Eu acho-a fascinante. Mas é sobretudo por causa da técnica - a secção minúscula que une o obelisco invertido à pirâmide (em frente à casa da minha avó havia um ferreiro, e estas coisas marcam)

Paulo disse...

Eu sei. Brincava (embora me pareça um valor disparatado para o efeito).