O meu post anterior, sobre o 3 de Outubro na Alemanha, destinava-se a preparar o texto que escrevi (finalmente) no Alegro Pianissimo.
Assim:
Eu sei que há poucas coisas mais irritantes que os emigrantes que se põem a dizer “cá neste meu país estrangeiro é tudo melhor”. E sei que de momento os portugueses gostam pouco das mensagens que recebem de Berlim... Mas tenho de contar este episódio: no dia 3 de Outubro de 2010 assisti com uma jovem portuguesa aos festejos berlinenses do 20º aniversário do Tratado da Reunificação Alemã. A cidade de Berlim comemorou esse momento histórico com uma festa sem exageros de discursos políticos (a Chanceler e o Presidente da República estavam presentes mas não discursaram), e um show com uma mensagem simples: gratidão e orgulho, conjugação harmoniosa das diferenças, aposta nos jovens, nas pessoas das regiões do Leste da Alemanha, nos que se entregam de corpo e alma a um sonho, e numa Europa como futuro e continuação lógica da reunificação. Estávamos ambas encantadas com aquela festa, mas ela tinha o coração em Portugal e nas comemorações do Centenário da República, e lamentava-se antecipadamente, certa de que “em Portugal vão estragar tudo”. Não sei se a festa em Portugal foi boa ou não: no dia 6 de Outubro de 2010 só ouvi falar do escândalo dos ausentes das cerimónias.
É isto que andamos a fazer ao nosso país: destruímos cínica e compulsivamente tudo o que possa ser oportunidade para ganhar uma consciência nacional positiva, tudo o que nos possa unir, tudo o que possa cimentar a nossa Democracia. E chegámos a um ponto em que as pessoas não querem ir votar, porque nenhum candidato lhes presta. E em que uma miúda de vinte anos sofre por antecipação, por partir do princípio que o seu país, podendo fazer boa figura, acaba por fazer da pior maneira possível.
Voltemos à Alemanha: em Bremen, onde decorreu a cerimónia oficial de comemoração, o Presidente da República lembrou o esforço de muitos países, pessoas e organizações, sem o qual a queda do muro não teria sido possível, falou do difícil processo de reunificação, louvou a acção de todos e os resultados já alcançados, e alargou a célebre frase “nós somos um povo” para nela caberem os estrangeiros que vivem neste país, dizendo que a Alemanha é um país de cristãos, de judeus e também de muçulmanos. Este Presidente não é propriamente um Obama, e o seu discurso não era uma obra-prima da retórica. Mas focou com firmeza e optimismo questões existenciais para esta sociedade, e deu uma orientação fundamental ao debate sobre a integração, que tinha descarrilado completamente com o episódio Sarrazin.
É para isto que um Presidente serve: para acreditar no melhor de um país, para lhe apontar um rumo muito para além dos interesses partidários e do ruído dos dias, para saber reconciliar um povo consigo próprio. E é de um Presidente assim que Portugal precisa urgentemente.
Do meu ponto de vista, Cavaco não serve estes desígnios. Se dúvidas houvesse, o seu mandato resolveu-as. O episódio Saramago, o “dia da raça” (vê-se bem que não lê jornais desde 1945), a aprovação de leis a contragosto quando o que o país precisava era de afirmações claras de princípios, tantos outros incidentes de cinzentismo...
Sobre os outros candidatos, decida cada um por si. E vá votar - em consciência, esperança e exigência. Não nos podemos demitir da responsabilidade de inventar um país novo. Não temos o direito de ficar em casa e deixar que outros decidam por nós, porque “assim como assim eles estragam tudo”. “Eles” somos nós, e “este país” é o único que temos para dar aos nossos filhos. Acredito que um Portugal melhor é possível. Um Portugal do qual nos possamos orgulhar. Sou uma sonhadora? Talvez. É que moro num país que entre 1933 e 1945 desceu muito mais baixo do que alguma vez Portugal conseguiria descer, e que nos últimos vinte anos tem trabalhado para unir dois povos - um dos quais foi sujeito durante quase meio século a uma poderosíssima máquina ditatorial e ideológica.
Se eles conseguiram, porque é que nós queremos desistir, e nem nos damos ao trabalho de ir votar? Ouçamos as palavras de Bärbel Boley, activista da RDA: “Nada nos era tão grande que não pudéssemos enfrentar, nada nos era tão pequeno que não valesse a pena cuidar.”
É por aí.
7 comentários:
GRANDE!
1,78
agora 1,79
:-)
Subscrevo, mas só depois de aplaudir!...
Essa assinatura está-te a sair um bocadinho torta...
Vá, acalma as mãos e assina depois!
;-)
Fico contente que vás votar. À minha volta há demasiada gente a dizer que não vai, ou vai e vota em branco.
Votar, em Democracia, é assim como era dantes o "turbo", no motor do carro: não há instrumento mais potente e poderoso, digam lá o que disserem!
Só mesmo quem não tenha Filhos se pode dar a esse faraónico luxo de consciência, que é prescindir de votar (de se "sujar"...), decisão que muito frequentemente releva de um puro preconceito de soberba relativamente aos "outros", à Sociedade em geral, ao "Mundo-cão" inteiro...
Entre os que têm filhos também há muito quem pense "depois de mim, o dilúvio". Isto é um mundo maluco.
E entre os que não os têm, também há quem dê tudo para melhorar o mundo. A madre Teresa, por exemplo. Ou o Ratzinger!
(hihihi)
Passo a descarada "provocação"...
Depois, há ainda um outro motivo de peso para votar, muito em especial nas eleições presidenciais, pois são as únicas onde se pode, com a máxima fidelidade, exprimir exactamente as nossas opções e escolhas, dada a inexistência de filtros entre a nossa decisão e os resultados!
Não há os círculos eleitorais, que podem forçar o voto útil (sobretudo nos que elegem poucos Deputados), não há hesitação possível entre percentagens de simpatia (que podem sempre ocorrer nas Legislativas, onde o ideal seria votar por um número fixo de pontos, a distribuir pelas várias listas), pois só há um lugar a preencher, e nem sequer há o filtro neutro e objectivo do método de Hondt!!!
Nas Presidenciais, ainda há menos desculpa para quem se abstém por escolha pessoal...
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