Lembram-se da entrevista que tive há algumas semanas?
Tratava-se de fazer um site na internet que atraísse leitores para depois lhes pespegar com publicidade.
(Aaaah, quem diria que as coisas funcionam assim? Primeiro vai-se ver quais são as palavras/frases mais procuradas de momento na internet, depois encomenda-se um texto a um redactor online onde essas palavras/frases apareçam, depois publica-se o texto, e depois enfia-se a publicidade discretamente pelos olhos adentro. Elementar, meu caro Watson, e nem sei porque não me ocorreu antes. Tanto mais que já há dez anos assisti a um processo semelhante: na empresa onde trabalhava, nos EUA, um dos colegas foi despedido em circunstâncias desumanas e humilhantes. Sem emprego, com família para sustentar, criou um site para as pessoas fazerem queixa dos patrões. Contarem as suas histórias, desabafarem para a net. Foi um sucesso: desataram a pipocar relatos de tragédias pessoais. Um dia destes hei-de ir saber se enriqueceu, ou se arranjou outro emprego.)
A meio da entrevista, alertaram-me para um debate que circula em certas esferas do universo paralelo: os que entendem que na internet deve haver qualidade, e os que já repararam que quanto menor a qualidade melhor vende, e por isso...
Perguntaram-me então: "você seria capaz de produzir conteúdos de baixa qualidade?"
Não conto o que respondi, mas algo me diz que foi aí que perdi o emprego.
Passo a pergunta, que é interessante: para ganhar dinheiro na internet, você seria capaz de baixar o seu nível de exigência intelectual?
8 comentários:
Nem de baixar nem de subir, acho eu: I am what I am...
Antes que toda a gente diga que nao senhor eu acrescento: E no trabalho que faz agora, para ganhar dinheiro, nunca sente que tem de baixar o seu nível intelectual?
Esta dava para deixares um inquérito aí ao lado.
E eis que a Rita toca num ponto muito interessante. Como vejo a Internet enquanto ferramenta de pesquisa e fonte de informação ou de entretenimento, só consigo produzir conteúdos, bons ou maus, de modo gratuito. Já no que diz respeito ao meu trabalho, o que me dá o pão para a boca, embora faça os possíveis por não baixar o nível, já algumas vezes me perguntei o que é que estava ali a fazer.
Não respondam mais!
Deixem-me continuar na doce inocência...
;-)
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Gi,
mas se "what I am" não atrai milhões de leitores, e é para isso que me pagam...?
Helena, aí provavelmente despedem-me... Aliás deve ser por isso que eu nunca consegui ganhar muito dinheiro.
Depende de quão desesperada estivesse por esse dinheiro. Se dependesse dele para viver, acho que sim. Pegando no ponto abordado pela Rita: quantos licenciados aceitam ser empregados de balcão, motoristas de táxi, baby-sitters, etc. por não arranjarem emprego ao seu nível?
A questão desviou-se, compreensivelmente (que atire a primeira pedra e tal...), para um binómio princípios/dinheiro. Mas a questão inicial parece-me a mais importante, no plano moral e no plano cívico, e trata, acho eu, do binómio princípios/consciência. Ou seja, sou capaz de viver em paz comigo mesmo traindo aquilo em que acredito? Isto independentemente daquilo que possa obter com essa traição, porque se optar por colocar as coisas nesse patamar já respondi "sim" à pergunta e estou apenas a negociar o preço.
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