No sábado passado levei a cimeira de blogues a Weimar.
Quem me conhece e ler isto, já deve estar a sentir bolhas psicológicas nos pés.
E quem não me conhece, que me compre:
allegro agitato
Num dia só, Berlim-Weimar com a tradicional aposta "quantos Antonov estão em Leipzig hoje?", passeio em passo de corrida por Weimar, a Eva de Rodin que se pode tocar, as pinturas murais dos estudantes da Bauhaus na escadaria da universidade (e que felizmente só foram cobertas com tinta, em vez de terem sido escavacadas pelas "belas" ideologias que por ali passaram), vá!, mais depressa!, o mausoléu da família ducal com a Maria Pawlowna ao lado do seu marido mas noutra terra e noutro templo, e mais o Goethe e mais o pseudo-Schiller, as casas dos escritores (a sorte de um e o azar do outro), a lindíssima sucessão de cores na casa de Goethe e a simplicidade da sua biblioteca apinhada de livros, almoço? uma salsicha grelhada que o tempo não dá para mais, o museu Bauhaus, comam depressa o gelado que o filme sobre o movimento Bauhaus está quase a começar!, o teatro onde foi lançada a República de Weimar, a escola Jenaplan, a Câmara Municipal e o seu carrilhão em cerâmica de Meissen, as influências italianas e o chato do Herder que não gostava da Itália, a Bastilha onde Bach esteve preso, o palácio novo com os seus belíssimos Cranach e peças de arte-sacra medieval que Goethe andou a coleccionar pelas aldeias da Turíngia (e mais a escadaria nobre de onde se avista a casa mais bonita de Weimar, e não digo a quem pertence, hehehe), a biblioteca Anna-Amalia, as invasões de Napoleão e o casamento apressado de Goethe, os bombardeamentos de puro terrorismo cultural no fim da guerra, o bairro Bauhaus na colina do outro lado do rio, o parque desenhado por Goethe e o abcesso do cemitério dos soldados russos que lá foi posto, a sala de aulas de Itten no parque, ao longe a casa do Paul Klee, mais perto a residência de Verão em forma de templo romano (mais uma obra do Goethe, aquele rapaz devia ser hiperactivo), o atelier do Feininger, andem! andem!, não adormeçam!, se era para descansar ficassem em casa!, a loja de produtos biológicos com o melhor leite que se vende na Alemanha, a casa de Franz Liszt, o hotel do Hitler.
allegro moderato
Entrámos na igreja do Herder, esta,
para ver o altar de Lucas Cranach d.ä., este,
onde os detentores do poder temporal aparecem quase tão grandes como Cristo na cruz.
Belos tempos.
Estavam a ensaiar uma cantata de Bach para o concerto do dia seguinte. Com tenor e flauta transversal.
Sentamo-nos nos bancos, estes,
e ficamos a ouvir um bocadinho.
Quatro filhos de Bach foram baptizados naquela mesma igreja. O orgão que lá está já não é o original, porque o tempo também por lá tem passado.
As bombas que naquele fatídico nove de Fevereiro de 1945 foram destinadas ao edifício acertaram-lhe em cheio. Quatro anos depois, Thomas Mann foi à cidade receber um prémio literário, e ofereceu esse dinheiro para a recuperação da igreja. Também aproveitou para perguntar o que se estava a passar "lá em cima, em Ettersberg", a floresta favorita de Goethe, onde os nazis instalaram Buchenwald e a seguir os russos o seu Campo Especial nº2. O campo especial foi imediatamente fechado, mas só depois da queda do muro foi possível responder abertamente à questão colocada pelo escritor quarenta anos antes.
largo
E Buchenwald - infelizmente em horário de inverno, com o portão aberto para o terreiro dos horrores, mas com os edifícios fechados.
lento moderato
Depois passeio e jantar em Erfurt, já em ritmo um pouco menos acelerado. Passear ao longo de ruas com casas do tempo de descoberta do Brasil. A igreja onde os pais de Bach casaram. O mosteiro onde Martinho Lutero foi monge. A ponte com casas mais longa de Europa, a bela rua medieval que se fez dentro dela. Discussão acesa: devíamos mudar para Weimar ou para Erfurt? Weimar tem uns palácios engraçados, mas aquelas casinhas de Erfurt com o terraço em cima da água...
andantino
Erfurt-Berlim. Cansados. Ambiente de regresso da romaria.
Esqueci-me de contar os Antonov em Leipzig.
adagio
Já contei que anda connosco um bebé de dez meses? Aposto que se não dissesse, não reparavam.
(Quem não me conhecer...)
Pois é: a bebé não gostou da sopa, e estava a morrer de fome. Perguntámos no restaurante se teriam uma peça de fruta, mas só tinham laranjas. E então a empregada disse "mas eu tenho uma banana que trouxe de casa, na minha carteira..." - e deu a banana à bebé.
Nunca mais ninguém se atreva a dizer à minha frente que os alemães são "todos" uns antipáticos.
(fotos tiradas daqui)
13 comentários:
Vontade de percorrer essa sinfonia...
Gi,
esta sinfonia não foi percorrida, foi corrida mesmo!
;-)
À parte ser um programa de estourar qualquer um, vale mesmo a pena.
Mas talvez fosse boa ideia dividi-lo por três dias. Ou mais.
Ah minha Dudamel querida! Isso é que foi dar-lhes! Imagino os arcos dos violinos e dos violoncelos com as cordas todas estraçalhadas ...
A palavrinha ali em baixo é dessupe: a lembrar-me a sopa que o docinho não quis comer e a generosidade da previdente alemã. Bonito adagio, em jeito de belo finale.
O título da sinfonia devia ser Presto, que isso andou aí tudo num Scherzo senza mercè. E no entanto, eu, como a Gi, que vontade ganho de a tocar também.
Paulo,
algo me diz que eu é que gostaria de te fazer correr assim. Mas ias exigir três dias, pelo menos.
Ainda agora estivemos a conversar sobre isso, a cimeira de blogues e eu: conhecemos algumas pessoas que não se sujeitariam a este ritmo de ver tudo e não saborear nada com tempo.
Ah sim. Três dias, à vontade. Que eu cá gosto de me sentar a ver quem passa.
Paulo,
se ainda por cima te queres sentar a ver quem passa, o melhor é combinar já uma semana!
(E agora muito a sério: se queres ir a Weimar, tenta estar lá no dia 1 de Maio - nesse dia fazem uma corrida de "carrinhos de rolamentos" que é imperdível)
O problema é que as pessoas costumam marcar umas feriazinhas de uma semana em Berlim, e esquecem-se que aqui mesmo ao lado há Potsdam, e um pouco mais longe é Weimar e Dresden, ou então o mar Báltico e a região de lagos a norte de Berlim. O refúgio do Bertolt Brecht, por exemplo.
Para quem, como eu, é muito tipo "já agora também podíamos...", é um desespero decidir o que é que não se vai visitar.
Bem, eu já fiz umas feriazinhas de uma semana em Berlim sem já agora e foram fantásticas, porque há tanto para ver em Berlim pela primeira vez e porque eu também gosto de me sentar a ver quem passa :-)
Por isso quando puder volto para os já agora, porque lhes tomei o gosto na Noruega ;-)
Talvez pudéssemos combinar mais uma cimeira de blogues...
Apoiado, Gi. A Berlim tem se ir, re-ir, e re-re-ir. Nem eu gosto de chegar ao fim de uma viagem e achar que já está tudo visto e não preciso de lá voltar (mesmo que venha a ser esse o caso).
Agora, Helena, como queres que eu vá em Maio a Weimar se é quando os alemães vêm todos para cá?
Então está bem, Paulo: anda em Abril, e chegas a Portugal logo no princípio de Maio (dia 2)...
(isto sou eu a tentar atirar o barro à parede a ver se cola)
Sinto-me assim... nem um convitezinho pequenino ao meu blogue? snif snif
Abrunho,
"cimeira de blogues" é uma maneira de dizer. Eu a brincar, como de costume.
Foi uma visita de amigos meus, uma família - e ele faz um dos melhores blogues portugueses. Quando escreve, diga-se de passagem.
Mas um dia que queiras sofrer muito em Weimar, diz. Com certeza que se arranja uma corrida para ti também.
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