Por exemplo, esta história:
Magalhães
O Pedro descalça-se antes de entrar. «Venho brincar».
Brincar com os castelos, às vezes é dos bons, às vezes é dos maus, até os guerreiros não serem suficientes. Aí, o Pedro e o meu dez anos, improvisam uma capa duma toalha que atam no pescoço e, com espadas de pau, batalham pela posse das escadas de caracol, até não ser suficiente. Saem para o jardim, para os campos, e conquistam árvore atrás de árvore, até ao muro que separa o meu terreno da horta dos pais dele. Estão próximo do tanque e resolvem apanhar lagartixas. São os dragões.
Chamo-os para lanchar e deixo-os sós na cozinha. «Arrumem tudo quando acabarem».
O Pedro vai ter um Magalhães, quando chegarem aqui. A julgar pela forma como coloca os sapatos, alinhados pelo tapete da entrada, cordões metidos para dentro para que os gatos não os mordam, a sua preocupação com as horas, «Já são cinco horas? Tenho de estar em casa às cinco para ajudar a minha mãe», a forma cuidadosa como devora os livros de história e ciências nas estantes dos meus filhos, e pela falta de luxos em casa, ele tratará o Magalhães como um tesouro. Quase teve um computador no último natal mas o pai juntou-se à mãe no desemprego e já não houve dinheiro.
- No fim de lanchar, podemos brincar no teu computador? – pergunta o Pedro.
- Podemos.
- Eu fico só a ver-te jogar. Posso enganar-me nas teclas e estragar-te o disco.
Ás vezes o Pedro trás um amigo. Ás vezes dois ou três.
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