09 abril 2008

estes alunos diabólicos

Mais dois episódios da escola primária Jenaplan:

Numa reunião de pais falou-se de uma aluna que tinha ataques de agressividade e começava a atirar cadeiras pelo ar. Um dos pais insistia que era preciso tirá-la daquela escola e pô-la noutra, para crianças "especiais". Vincava que era preciso tomar urgentemente uma atitude, antes que uma cadeira acertasse na cabeça de outra criança.
A professora começou a falar como se estivesse apenas a pensar em voz alta: por causa dessa aluna fizemos uma reunião com todo o pessoal que trabalha na escola... durante duas horas perguntamo-nos em que contextos tinham surgido as crises... porque é que ela faz isso? o que devemos fazer para evitar situações em que ela fica agressiva? combinámos que não a podemos deixar sozinha em momento algum e que temos de estar atentos para evitar as situações em que ela é provocada pelos outros.
Até me esqueci das consequências de uma cadeira na cabeça do meu filho. Só pensei: abençoados professores que tentam ir ao fundo das questões em vez aproveitarem a oportunidade para se verem livres dos problemas.

Numa das semanas de projecto fiquei responsável por fazer um poster com os alunos. Durante esses dias tive oportunidade de conversar com uma das alunas mais problemáticas da escola. Enquanto íamos pintando, ela contava: que vivia só com a mãe, que esta trabalhava num restaurante, que às vezes ela comia no restaurante mas a dona não gostava, e ralhava com a mãe mesmo à frente da criança. E que no restaurante anterior ainda tinha sido pior.

***

Ouvi de uma professora de liceu, com experiência internacional e em várias regiões da Alemanha, que só no Leste deste país assistiu ao extraordinário fenómeno de olhar para os alunos enquadrando-os num contexto familiar mais ou menos público.
Reuniões de notas em que um professor comenta que um aluno está a baixar o rendimento e logo vêm outros colegas contar que a avó dele está no hospital, e que o cão morreu, etc.

Lembro-me também muitas vezes do que a directora do liceu dos meus filhos me respondeu, quando eu comentei que iam entrar quatro miúdos muito especiais para essa escola: "Só quatro? Setenta! Todos os alunos desta escola são miúdos muito especiais!"

Quando a escola olha assim para os seus alunos, é mais difícil entrar numa dinâmica de diabolização.

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