23 junho 2021

autonomia

Esta semana lembrei-me do poço ao fundo do quintal da minha avó, aonde se ia buscar água várias vezes por dia. Tinha uma tampa de madeira que se levantava com facilidade para fazer descer o balde suspenso numa roldana presa a um arco de ferro sobre a abertura. Lembro-me bem dos dois medos enormes que tinha: o de cair lá dentro, ou o de não segurar a corrente que prendia o balde e ela cair atrás dele, deixando-nos para sempre sem acesso àquela água. Não sei como é que a minha avó e os meus pais fizeram, mas nunca nenhum de nós os cinco caiu ao poço, ou deixou cair a corrente. Apesar de nos deixarem andar pelo terreiro, à solta, o tempo que nos apetecesse.

Também me lembrei da minha determinação a pegar na mão do meu irmão no primeiro dia em que fomos a pé para o infantário: "anda, nós vamos conseguir!" Ele teria quatro anos e meio, e eu estaria a dois ou três meses de fazer três anos. Já tinha largado as fraldas, mas ainda me distraía volta e meia. O caminho para o infantário tinha mais de um quilómetro, havia várias ruas para atravessar, e uma delas era a rodovia com 4 faixas de rodagem. Nessa discutíamos sempre muito, porque eu me recusava a atravessar se visse algum carro, por muito longe que ele viesse.

Foi a propósito do "bebé Noah" que pensei em tudo isso, e particularmente na idade desses dois miúdos que iam sozinhos para o infantário - eu era apenas uns meses mais velha do que ele é.

Também tenho pensado num diálogo que ouvi entre mãe e filho: - Mãe, posso subir a esta árvore? - Se te parece que consegues, podes.

Criar filhos não é protegê-los permanentemente contra todos os riscos do mundo. É ajudá-los a ganhar uma autonomia bem ancorada na consciência de si próprios, das suas possibilidades e das suas responsabilidades.


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