Ontem fui à zona comercial do meu bairro comprar um rato novo para o computador, e ao sair da loja vi uma ambulância parada junto ao passeio, um homem deitado no chão, alguém a tentar reanimá-lo - e um semi-círculo de mirones.
O corpo no chão tinha uma barriga grande, que, a cada massagem cardíaca, estremecia e rolava como uma onda. Desviei o olhar. Estava ali um homem a morrer, e os esforços para o salvar expunham-no ainda mais na sua trágica vulnerabilidade.
Afastei-me. Fui comprar pão, e ervas, e legumes. A senhora da padaria não atinava com nada do que era preciso - nem o preço do kg, nem a largura das fatias -, mas ali ao lado estava um homem a morrer, e de repente nada era preciso excepto que conseguissem salvá-lo.
Ao sair da loja de produtos biológicos ouvi sirenes várias - polícia, mais ambulâncias, médico. Segui caminho na direcção oposta, resistindo à vontade de ir saber daquele homem deitado no passeio, tão perto de mim e talvez já irremediavelmente longe.
O nosso pulso a bater tranquilamente enquanto atravessamos o quotidiano: raramente temos consciência do privilégio e do risco.
--- "Pulso" era o tema desta semana no Largo. Se quiserem ler como elas pulsam:
- A curva
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