01 maio 2025

*trabalhadora*



(fotografia de Eduardo Gageiro, 1º de Maio de 1974)

Não vai há muito tempo que, para conseguir determinado cargo laboral, uma mulher tinha de provar valer o dobro do seu concorrente masculino. Ao mesmo tempo, contava-se com ela para assegurar um turno suplementar fora do emprego: pôr a comida na mesa, cuidar dos filhos e dos familiares mais velhos, tratar da casa e das roupas.

Em termos de exigências de trabalho, era esta a equação: 

trabalhadora = 3 x trabalhador

Entretanto, já fizemos muito caminho. Hoje em dia, um a no final da palavra trabalhador pesa bem menos do que há meio século.

Contudo, não se avançou tanto quanto é necessário - a julgar pelas estatísticas de desigualdade de salários e de carga horária total, ou, num registo mais humorístico, considerando alguns apontamentos de stand-up comedy feminista e o modo como o nosso riso se encrava na garganta:

"Vocês nem imaginam a profissional espectacular que eu podia ser se tivesse uma esposa!", ou:

"A prova de que ainda não há igualdade é que muitos homens têm famílias paralelas, mas as mulheres não. Afinal de contas, a mulher nenhuma ocorreria, depois de pôr os filhos na cama e arrumar a cozinha, meter-se no carro e ir ter com a sua outra família para lhes limpar a casa de banho..." 

Mais ainda: estamos a caminho, e nada nos garante que a direcção continue a ser rumo ao futuro. Uma pequena margem percentual no resultado das eleições é quanto basta para remeter as mulheres à antiquíssima desigualdade e à condição primordial de parideiras. As polacas que o digam, as norte-americanas que o digam.

Pelo que pergunto: será que vivemos numa ilusão de progresso, e este é apenas aparente e sempre reversível? Será que uma certa ideia do masculino e do feminino ainda está bem viva em muitas mentes, apenas à espera de uma oportunidade para voltar ao espaço público? E será que o velho machismo, tantas vezes invisível para o seu portador, explica uma parte da determinação com que certos discursos da Esquerda acusam a luta feminista de dividir a classe trabalhadora?

Neste 1 de Maio, mais do que nunca, é preciso lembrar que a luta pelos direitos dos trabalhadores tem de ser também a luta pela mudança da equação. Um dia, quando esta for

trabalhadora = trabalhador

saberemos que vale a pena lutar lado a lado, e que estamos unidos pela mesma luta.

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As outras trabalhadoras deste Largo da escrita:

A Curva
A Gata Christie
Boas Intenções
Gralha dixit
O blog azul turquesa
Panados e Arroz de Tomate
Quinta da Cruz de Pedra

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