03 agosto 2023

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Nas suas primeiras horas nas JMJ em Portugal, o papa Francisco encontrou-se com algumas das pessoas que foram vítimas de abuso sexual no seio da Igreja Católica, a quem pediu perdão em seu nome e no da sua Igreja. Nos Jerónimos, na celebração de Vésperas com bispos, padres e responsáveis de instituições católicas, falou-lhes do "grito de sofrimento das vítimas, que se devem acolher e escutar".

Ao longo dos meses que antecederam as JMJ, vivi com a esperança e a expectativa de que os responsáveis da Igreja Católica portuguesa encontrariam um símbolo para tornar presente este grito de sofrimento em cada celebração, em cada local de encontro e em cada cartaz das Jornadas. Verifico, com muito pesar, que esse gesto ficou esquecido algures. Por isso, associando-me ao papa Francisco no esforço prioritário de reconhecer a existência e o sofrimento das vítimas e de condenar os actos e as omissões, peço que partilhem esta imagem como puderem e entenderem.

Aos organizadores e aos participantes nas Jornadas, digo que não pode haver verdadeira festa no espírito de Jesus Cristo sem se olhar de frente para "o elefante no meio da sala": no seio da Igreja Católica portuguesa, milhares de crianças foram repetidamente abandonadas à mercê das mãos imundas de alguns padres, que elas, na sua inocência infantil, revestiam com uma aura de sagrado, vendo-os como amigos especiais de Jesus. Os membros da hierarquia da Igreja que protegeram esses homens não apenas esconderam e até potenciaram os seus crimes horrendos, mas tornaram-se também cúmplices num ignóbil ultraje do divino.

Tenho a certeza de que, se comparecesse em pessoa às JMJ em Portugal, Jesus Cristo subiria aos altares de mão dada com as vítimas, e se ajoelharia para lhes lavar os pés antes de se sentar com elas à mesa. Não tenho dúvidas de que expulsaria furiosamente do templo alguns membros da hierarquia ali presentes, acusando-os de, com o seu silêncio indiferente e a sua falta de empatia para com as vítimas, nomeadamente quando foram conhecidos os factos do relatório sobre os abusos, terem falhado ao essencial do espírito cristão. 

Partilho esta imagem porque penso que só pode haver verdadeira Festa e Comunhão Cristã nas JMJ se as vítimas de abuso sexual no seio da Igreja Católica estiverem presentes nas nossas consciências e - ao menos simbolicamente - sentadas em lugar de destaque à mesa do Senhor. 


 


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