Na semana passada regressei à Filarmonia, depois de um longo interregno, para ver o Viotti (melhor dizendo: para pôr os olhinhos de molho no Viotti - e os ouvidinhos também). Mas como comprei os bilhetes demasiado tarde fiquei muito longe, precisei de binóculos. O que é triste, porque assim uma pessoa não disfarça nada ao que vem.
Há dias tive (sei lá!) uma espécie de lembrança, fui ver se havia bilhetes, e descobri que recomeçaram a vender os lugares do coro. Finalmente! E como aparentemente mais ninguém tinha tido a mesma lembrança, ainda havia muitos bilhetes à venda. Online e tudo, um luxo!
De modo que lá fui eu ver o Kirill Petrenko a apresentar a estreia mundial de "Unstuck", de Andrew Norman (e agora digo, só para me armar: conheço muito bem, já cantei a estreia mundial de uma ópera dele), Mozart (concerto nº1 para violino e orquestra com o solista Noah Bendix-Balgley), e Korngold (o compostior que, para escapar ao Holocausto, foi parar a Hollywood, onde fez música de cinema e lhe aconteceu um pequeno percalço: o seu estilo marcou de tal maneira a música de cinema que agora, quando as pessoas ouvem as outras músicas dele, dizem que parece música de cinema, em vez de dizerem, ao ouvir música de cinema, que parece música do Korngold) (isto era o que vinha no programa do concerto).
Adiante. O Petrenko continua um doce de maestro. Gosto especialmente quando, em pleno concerto, agradece aos músicos terem tocado determinada passagem tal e qual como ele a queria. Continua a ser um prazer enorme assistir aos concertos nos bancos mesmo por trás da orquestra. Tanto mais que não preciso dos binóculos para nada, consigo disfarçar muito melhor assim.
Hoje tive mais uma espécie de lembrança, e fui ver o trailer deste concerto, que é feito com imagens desse dia em que eu assisti sentada num dos bancos do coro. Era o que temia: lá estou eu, mesmo no meio (fácil de ver: estou de máscara), e a câmara apanha-me exactamente no momento em que estremeço e ergo os olhos para o céu porque me alembrou repentinamente, em pleno Korngold, que me tinha esquecido das tigelas de marmelada a secar ao sol na varanda. E já era noite, e ameaçava chuva.
É a má sorte do Korngold, coitado: a música dele tem queda para filmes.
(Podem ver o trailer aqui - carreguem em "Vorschau". O momento "ai minha rica marmeladinha" é por volta de 1'28'')
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