02 abril 2022

o oligarca meu vizinho

 


Li uma notícia sobre os magnatas russos que têm casa em Berlim. Surpresa, surpresa: escolheram Grunewald e as suas vizinhanças em Zehlendorf. Uns gostam de ter um lago ao fundo do jardim, outros se calhar preferem Cranach e foram para os lados do Jagdschloss Grunewald.

Fiquei a saber que um deles tem a sua pequena datcha numa rua onde passo muitas vezes com o Fox. O nosso rafeirito de Albergaria até já lhe marcou várias vezes o muro do jardim como território português. [ O nosso cão é um bocado racista, especialmente contra os golden retriever. Isso, e a falta de respeito pelas propriedades da população russa na berlinense "Charlottengrad": é quanto basta para Putin achar que ele está a ameaçar os interesses do seu povo, e querer desnazificar Portugal. Nunca se sabe. Tanto mais que Portugal tem portos muito apetecíveis. ]

Por um lado, confesso, é uma sensação estranha ver-me vizinha de pessoas que não se sabe como enriqueceram. Por outro lado, confesso com ainda maior vergonha, ocorreu-me que, estando rodeada de datchas de russos poderosos, talvez seja menos provável que me caia uma bomba atómica em cima da cabeça. Ri-me rapidamente de mim própria, mas fiquei a pensar naquela história de quem abandona primeiro o navio que se afunda. Se for mesmo a sério, se for literalmente uma questão de vida ou de morte: que vai restar dos nossos princípios e valores?

[ E, já que estou a falar em "vida e morte, literalmente": sou só eu que tenho a impressão que há pessoas a falar da guerra na Ucrânia como se fosse um jogo de vídeo, onde em vez de morrerem pessoas desaparecem avatares? Há 20 anos, algumas delas ficaram tão chocadas como eu por Rumsfeld chamar "danos colaterais" aos civis iraquianos que o seu exército invasor matava. Mas como desta vez não são os EUA quem anda a provocar shock and awe nas cidades... ]

Voltando ao meu artigo: li também que um desses riquíssimos russos deu uma entrevista na Wiener Konditorei da Hagenplatz, o que me provocou grande desconforto. Então estas pessoas tão bem instaladas no regime de Putin também frequentam a minha confeitaria, o lugar onde, em manhãs de pequeno-almoço melhorado, compro pãezinhos e croissants? I love the smell of novichok in the morning...


3 comentários:

jj.amarante disse...

A imagem está belíssima, o Fox também.

Paulo disse...

De repente pareceu-me que estava a pairar por aí.

Helena Araújo disse...

Obrigada, jj.amarante.
Estava um dia de luxo. :)

Por causa dos croissants da Wiener Konditorei, Paulo?
Aquele detalhe deu cabo de mim. A consciência da proximidade desse mundo que só conheço da secção internacional dos jornais e revistas.