No segundo feriado de Natal (na Alemanha, o 26 de Dezembro também é feriado), visitámos a minha sogra, e celebrámos o Natal à antiga: com a carne assada que ficou a marinar em vinho durante vários dias, com um pinheirinho verdadeiro e com velas, com a leitura que São Lucas nos oferece sobre o nascimento de Jesus, com música feita por nós.
O pinheiro verdadeiro e as velas de cera de abelhas são algo cada vez mais raro nas casas alemãs. As velas estão a ser trocadas por guirlandas eléctricas, e os pinheiros de Natal estão a ser reinventados com muita criatividade. Na casa dos amigos com quem passámos os últimos dias do ano havia um pinheiro de natal feito com ramos devolvidos à terra pelo lago Constança. No ano passado, na nossa casa em Berlim, usámos ramos encontrados no chão da floresta.
Num programa de rádio ouvimos um apontamento sobre as diferenças na celebração do Natal, que variam de país para país. Eu ouvia, à espera do momento em que explicariam que grande parte dessas diferenças se deve à importância maior que em certas regiões ainda se dá à festa da Epifania. Mas não. Limitaram-se a informar que há diferenças. Pode ser de ter vivido quase 40 anos no milénio passado, ou então é mesmo algo que tem acontecido a todas as pessoas que vão envelhecendo, desde o princípio dos tempos: esta perplexidade perante o desaparecimento de saberes que em tempos eram intrínsecos à sociedade.
E também a surpresa perante a novidade. Por exemplo, um amigo nosso que este Natal ofereceu aos filhos o regresso da pegada ecológica de cada um deles à casa de partida. Sim, também fiquei de boca aberta, mas ele explicou: fez as contas à emissão de dióxido de carbono de cada um dos filhos, desde que nasceram até hoje, e pagou a uma ONG o necessário para contrabalançar essas emissões. A ONG de que me falou vai muito além da plantação de árvores. Entre outros projectos, distribui fogões solares em regiões onde ainda é normal cozinhar com fogueiras.
Outra surpresa: os filhos gostaram do presente. O que me lembrou uma festa de Natal há alguns anos, quando, para evitar a habitual avalanche de presentes de todos a todos, combinámos que cada pessoa daria apenas um, e que estes seriam sorteados num jogo de dados. Quem tivesse dois seis escolhia o presente embrulhado, e depois de todos os presentes estarem distribuídos desembrulhava-se e fazia-se nova rodada. Quem tivesse dois seis podia roubar o presente a outrem. Pode criticar-se que este roubalhanço não é muito próprio do espírito de Natal, mas, pensando bem, também aqui podemos tentar alguma diferença. Por exemplo, "roubando" o presente que ninguém quer. Nessa noite, os presentes que ninguém queria foram - surpresa! surpresa! - dois donativos para ONGs que lutam para tornar o mundo melhor. Vá-se lá saber porquê, todos preferiam ter a french press ou o jogo "Azul" (com pedras lindíssimas a imitar azulejos portugueses).
O Azul acabou por ficar para mim (sim: nesse dia o meu espírito natalício não esteve brilhante) mas depois de jogar uma vez dei-o a um dos perdedores. E não foi por altruísmo. Odeio jogos que vivem da maldade do adversário. (Disse maldade, não disse a inteligência ou sorte.) E assim termino esta publicação de extraordinária actualidade: há quem comece a encher as lojas de produtos de Natal logo em Outubro, eu cá escrevo um post de Natal quando o Carnaval já está à porta...
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