Tento
compreender os motivos que podem levar os encarregados de educação a alegar
objecção de consciência para impedirem os menores a seu cargo de frequentar a
disciplina obrigatória de Educação para a Cidadania e o Desenvolvimento, mas
está difícil, porque os argumentos permanecem demasiado vagos. Limitam-se a
falar em "ideologia" e "temas que não são do âmbito da
escola". Se pergunto um pouco mais, falam-me em "sexualidade" e
"ideologia de género". Mas o que quer dizer isso, concretamente?
No final deste post partilho as linhas orientadoras desta disciplina, e apelo aos objectores de consciência para que informem sobre quais são as partes do programa dessa disciplina com as quais não concordam, e porquê. Agradeço também que apresentem casos reais de excessos cometidos em alguma escola, para podermos averiguar se se trata de um excesso ocasional a corrigir localmente, ou se é algo que abrange todo o sistema.
Quanto aos argumentos que já avançaram relativos a "sexualidade" e "ideologia de género", pergunto aos objectores de consciência:
1. Porque é
que, no que diz respeito à sexualidade, não querem que os menores a vosso
cuidado recebam da escola "informações rigorosas relacionadas com a
protecção da saúde e a prevenção do risco"? (v. as linhas orientadoras da disciplina,
que partilho abaixo)
Ou será que conhecem casos de professores que se excederam, e trataram o tema
"sexualidade" de uma forma nociva aos interesses dos alunos?
2. Porque é que não querem que a escola desconstrua "preconceitos e estereótipos de género, de forma a garantir as mesmas oportunidades educativas e opções profissionais tanto para rapazes como para raparigas"? Porque é que uma sociedade que tem a igualdade de oportunidades como princípio básico deve reconhecer a um encarregado de educação o direito de inculcar princípios contrários àquele, sem que ao menor seja oferecida a possibilidade de qualquer contraditório?
3. Porque é
que não querem que a escola informe os menores a vosso cuidado sobre a
existência de orientações sexuais diversas, e lhes incuta o princípio do
respeito por todas as pessoas, independentemente da sua orientação sexual?
Ou será que conhecem casos de professores que se excederam, e - por exemplo - fizeram a apologia dessas
orientações sexuais como algo preferível à heterossexualidade?
4. Porque é que não querem que a escola informe os menores a vosso cuidado sobre a existência de pessoas que não identificam o seu género com o seu sexo biológico, sublinhando que essas pessoas merecem respeito? O que há de errado na informação sobre a existência de pessoas transexuais, e no alertar para as dificuldades da sua vida no contexto de uma sociedade maioritariamente binária?
Será que acreditam realmente que essas pessoas não existem? E, nesse caso, por que motivo deve a sociedade reconhecer a um encarregado de educação o direito de negar ao menor a seu cuidado informações fundamentais para a coexistência numa comunidade mais diversa do que aquilo que esse adulto está capaz de reconhecer e aceitar?
Agradeço sinceramente que me respondam a estas questões.
--------
Educação paraa Cidadania - Linhas Orientadoras
A prática da
cidadania constitui um processo participado, individual e coletivo, que apela à
reflexão e à ação sobre os problemas sentidos por cada um e pela sociedade. O
exercício da cidadania implica, por parte de cada indivíduo e daqueles com quem
interage, uma tomada de consciência, cuja evolução acompanha as dinâmicas de
intervenção e transformação social. A cidadania traduz-se numa atitude e num
comportamento, num modo de estar em sociedade que tem como referência os
direitos humanos, nomeadamente os valores da igualdade, da democracia e da
justiça social.
Enquanto
processo educativo, a educação para a cidadania visa contribuir para a formação
de pessoas responsáveis, autónomas, solidárias, que conhecem e exercem os seus
direitos e deveres em diálogo e no respeito pelos outros, com espírito
democrático, pluralista, crítico e criativo.
A escola
constitui um importante contexto para a aprendizagem e o exercício da cidadania
e nela se refletem preocupações transversais à sociedade, que envolvem
diferentes dimensões da educação para a cidadania, tais como: educação para os
direitos humanos; educação ambiental/desenvolvimento sustentável; educação
rodoviária; educação financeira; educação do consumidor; educação para o
empreendedorismo; educação para a igualdade de género; educação intercultural;
educação para o desenvolvimento; educação para a defesa e a segurança/educação
para a paz; voluntariado; educação para os media; dimensão europeia da
educação; educação para a saúde e a sexualidade.
Sendo estes
temas transversais à sociedade, a sua inserção no currículo requer uma
abordagem transversal, tanto nas áreas disciplinares e disciplinas como em
atividades e projetos, desde a educação pré-escolar ao ensino secundário, de
acordo com os princípios definidos no Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho,
com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 91/2013 de 10 de julho.
Subjacente a esta conceção educativa, está uma visão integradora das diversas
áreas do saber que atravessa toda a prática educativa e que supõe, para além de
uma dinâmica curricular, também uma vivência de escola, coerente e sistemática,
alargada ao contexto em que esta se insere.
A abordagem
curricular da educação para a cidadania pode assumir formas diversas, consoante
as dinâmicas adotadas pelas escolas no âmbito da sua autonomia, nomeadamente
através do desenvolvimento de projetos e atividades da sua iniciativa, em
parceria com as famílias e entidades que intervêm neste âmbito, no quadro da relação
entre a escola e a comunidade. Não sendo imposta como uma disciplina
obrigatória, é dada às escolas a possibilidade de decidir da sua oferta como
disciplina autónoma, nos 1.º, 2.º e 3.º ciclos do ensino básico. Deste modo, a
educação para a cidadania pode ser desenvolvida em função das necessidades e
problemas específicos da comunidade educativa, em articulação e em resposta a
objetivos definidos em cada projeto educativo de agrupamento de escola ou
escola não agrupada.
Atendendo à
importância que o Ministério da Educação e Ciência reconhece a esta área
curricular, têm vindo a ser produzidos, em colaboração com outros organismos e
instituições públicas e com diversos parceiros da sociedade civil, documentos
que se poderão constituir como referenciais na abordagem das diferentes
dimensões de cidadania. Os referenciais e outros documentos orientadores não
constituem guias ou programas prescritivos, mas instrumentos de apoio que, no
âmbito da autonomia de cada estabelecimento de ensino, podem ser utilizados e
adaptados em função das opções a definir em cada contexto, enquadrando as
práticas a desenvolver.
As diversas
dimensões da educação para a cidadania são já objeto de trabalho em muitas
escolas, quer transversalmente, quer através de ofertas curriculares
específicas e de projetos. As dimensões para as quais já foram elaborados ou
estão em elaboração documentos orientadores para as escolas são, nomeadamente:
A Educação
Rodoviária, que se assume como um processo de formação ao longo da vida que
envolve toda a sociedade com a finalidade de promover comportamentos cívicos e
mudar hábitos sociais, de forma a reduzir a sinistralidade rodoviária e assim
contribuir para a melhoria da qualidade de vida das populações.
A Educação para
o Desenvolvimento, que visa a consciencialização e a compreensão das causas dos
problemas do desenvolvimento e das desigualdades a nível local e mundial, num
contexto de interdependência e globalização, com a finalidade de promover o
direito e o dever de todas as pessoas e de todos os povos a participarem e
contribuírem para um desenvolvimento integral e sustentável.
A Educação
para a Igualdade de Género, que visa a promoção da igualdade de direitos e
deveres das alunas e dos alunos, através de uma educação livre de preconceitos
e de estereótipos de género, de forma a garantir as mesmas oportunidades
educativas e opções profissionais e sociais. Este processo configura-se a
partir de uma progressiva tomada de consciência da realidade vivida por alunas e
alunos, tendo em conta a sua evolução histórica, na perspetiva de uma alteração
de atitudes e comportamentos.
A Educação
para os Direitos Humanos, que está intimamente ligada à educação para a
cidadania democrática, incidindo especialmente sobre o espectro alargado dos
direitos humanos e das liberdades fundamentais, em todos os aspetos da vida das
pessoas, enquanto a educação para a cidadania democrática se centra,
essencialmente, nos direitos e nas responsabilidades democráticos e na
participação ativa nas esferas cívica, política, social, económica, jurídica e
cultural da sociedade.
A Educação
Financeira, que permite aos jovens a aquisição e desenvolvimento de
conhecimentos e capacidades fundamentais para as decisões que, no futuro, terão
que tomar sobre as suas finanças pessoais, habilitando-os como consumidores, e
concretamente como consumidores de produtos e serviços financeiros, a lidar com
a crescente complexidade dos contextos e instrumentos financeiros, gerando um
efeito multiplicador de informação e de formação junto das famílias.
A Educação
para a Segurança e Defesa Nacional, que pretende evidenciar o contributo
específico dos órgãos e estruturas de defesa para a afirmação e preservação dos
direitos e liberdades civis, bem como a natureza e finalidades da sua atividade
em tempo de paz, e ainda contribuir para a defesa da identidade nacional e para
o reforço da matriz histórica de Portugal, nomeadamente como forma de
consciencializar a importância do património cultural, no quadro da tradição
universal de interdependência e solidariedade entre os povos do Mundo.
A promoção do
Voluntariado, que visa o envolvimento das crianças e dos jovens em atividades
desta natureza, permitindo, de uma forma ativa e tão cedo quanto possível, a
compreensão que a defesa de valores fundamentais como o da solidariedade, da
entreajuda e do trabalho, contribui para aumentar a qualidade de vida e para
impulsionar o desenvolvimento harmonioso da sociedade. A criação de uma cultura
educacional baseada na defesa destes mesmos valores reforça a importância do
voluntariado como meio de promoção da coesão social.
A Educação
Ambiental/Desenvolvimento Sustentável, que pretende promover um processo de
consciencialização ambiental, de promoção de valores, de mudança de atitudes e
de comportamentos face ao ambiente, de forma a preparar os alunos para o
exercício de uma cidadania consciente, dinâmica e informada face às
problemáticas ambientais atuais. Neste contexto, é importante que os alunos
aprendam a utilizar o conhecimento para interpretar e avaliar a realidade
envolvente, para formular e debater argumentos, para sustentar posições e
opções, capacidades fundamentais para a participação ativa na tomada de
decisões fundamentadas no mundo atual.
A Dimensão
Europeia da Educação, que contribui para formação e envolvimento dos alunos no
projeto de construção europeia, incrementando a sua participação, reforçando a
proteção dos seus direitos e deveres, fortalecendo assim a identidade e os
valores europeus. Pretende-se promover um melhor conhecimento da Europa e das
suas instituições, nomeadamente da União Europeia e do Conselho da Europa, do
património cultural e natural da Europa e dos problemas com que se defronta a
Europa contemporânea.
A Educação
para os Media, que pretende incentivar os alunos a utilizar e decifrar os meios
de comunicação, nomeadamente o acesso e utilização das tecnologias de
informação e comunicação, visando a adoção de comportamentos e atitudes
adequados a uma utilização crítica e segura da Internet e das redes sociais.
A Educação
para a Saúde e a Sexualidade, que pretende dotar as crianças e os jovens de
conhecimentos, atitudes e valores que os ajudem a fazer opções e a tomar
decisões adequadas à sua saúde e ao seu bem-estar físico, social e mental. A
escola deve providenciar informações rigorosas relacionadas com a proteção da
saúde e a prevenção do risco, nomeadamente na área da sexualidade, da
violência, do comportamento alimentar, do consumo de substâncias, do
sedentarismo e dos acidentes em contexto escolar e doméstico.
A Educação
para o Empreendedorismo, que visa promover a aquisição de conhecimentos,
capacidades e atitudes que incentivem e proporcionem o desenvolvimento de
ideias, de iniciativas e de projetos, no sentido de criar, inovar ou proceder a
mudanças na área de atuação de cada um perante os desafios que a sociedade
coloca.
A Educação do
Consumidor, que pretende disponibilizar informação que sustente opções
individuais de escolha mais criteriosas, contribuindo para comportamentos
solidários e responsáveis do aluno enquanto consumidor, no contexto do sistema
socioeconómico e cultural onde se articulam os direitos do indivíduo e as suas
responsabilidades face ao desenvolvimento sustentável e ao bem comum.
A Educação
Intercultural, que pretende promover o reconhecimento e a valorização da
diversidade como uma oportunidade e fonte de aprendizagem para todos, no
respeito pela multiculturalidade das sociedades atuais. Pretende-se desenvolver
a capacidade de comunicar e incentivar a interação social, criadora de
identidades e de sentido de pertença comum à humanidade.
Tento
compreender os motivos que levam encarregados de educação a alegar
"objecção de consciência" para impedir que os seus filhos frequentem
esta disciplina, mas debato-me sempre com a falta de informação. Os motivos
apresesentados são vagos ("temas que competem às famílias",
"ideologia"). Os casos concretos são inexistentes. Ou então, sou eu
que estou mal informada.
Se bem
entendi, o problema reside nos temas "sexualidade" e "
A Educação
para a Igualdade de Género, que visa a promoção da igualdade de direitos e
deveres das alunas e dos alunos, através de uma educação livre de preconceitos
e de estereótipos de género, de forma a garantir as mesmas oportunidades
educativas e opções profissionais e sociais. Este processo configura-se a
partir de uma progressiva tomada de consciência da realidade vivida por alunas
e alunos, tendo em conta a sua evolução histórica, na perspetiva de uma
alteração de atitudes e comportamentos.
Sem comentários:
Enviar um comentário