16 julho 2020

Locronan (3) ou: viagem vertiginosa às origens



Encontrámos ao cimo da rua Moal uma loja que estava aberta e vazia de gente, como a igreja. Quando nos dispúnhamos a continuar o passeio, apareceu o dono, a suplicar para que entrássemos. Mesmo que não comprássemos nada, era mesmo só pela companhia. Estava farto do silêncio. Ensaiou algumas frases curtas em alemão. Nascera em Baden-Baden, na zona de ocupação francesa. Adenauer e De Gaulle tinham imposto por decreto a amizade franco-alemã - dizia ele com um brilho trocista no olhar - e o pai dele tentava pôr o decreto em prática. A Floresta Negra fervilhava de caça, mas os alemães estavam proibidos de ter armas. O pai dele ia caçar toda aquela bicharada, enchia a mala do carro e mais um atrelado, e distribuía pela população.

- Que resta dessa amizade decretada?, perguntou. A Merkel não tem visão, gere o seu país e o mundo com mentalidade de "mãe de família". Em lado nenhum se vêem políticos com capacidade para "decretar o futuro". 

Sem pausa, mudou de tema para falar da história da Bretanha. Perguntei-lhe se me sabia explicar porque é que o cristianismo bretão tinha vindo do norte, por barco, em vez de vir do sul, por terra - e ele lançou-se numa viagem vertiginosa ao início do mundo, que pelos vistos tem estado desde sempre intimamente ligado ao povo bretão.

Se bem entendi, foi assim: quando o Jardim do Éden se transformou no deserto do Saara - uma alteração decorrente das oscilações do eixo da terra a cada 25 milénios, que terá acontecido ao longo de apenas 150 anos e foi praticamente contemporânea do Dilúvio -, os povos que viviam nessa região paradisíaca fugiram para o Egipto, levando consigo todos os seus saberes. É essa diáspora que está na origem da ascensão da cultura egípcia. Mais tarde esses estrangeiros tiveram de fugir, e foram para Israel. Acontece que entre eles havia uns bélicos e outros pacifistas. Os bélicos deram origem à narrativa bíblica, os pacifistas deram-se mal: os bélicos venderam-nos como escravos aos assírios. Quando o povo medo venceu os assírios, estas populações escravas foram libertadas e espalharam-se pelo mundo. Passaram pela Arménia (onde os estudiosos encontraram ligações fortes à cultura bretã) e vieram até ao Norte da Europa. A tribo Dan (preto, em bretão) instalou-se na Dinamarca; a tribo Ruz (vermelho, em bretão) ficou na Rússia; e a Gwen (branco, em bretão) veio para a Bretanha. Recentemente encontraram na Mongólia vestígios de um povo misterioso que ali se teria instalado na mesma época em que estas tribos andavam em fuga. Eram peritos no trabalho do bronze, e tinham megálitos. Bem podiam ser primos dos bigoudens, que são mongóis: têm traços asiáticos no rosto, e até a marca mongol nas costas.

Saímos da loja um pouco atordoados com esta história vertiginosa.
Tão atordoados que só alguns dias mais tarde caí em mim: como é que um povo com saber suficiente para fazer os templos do Egipto perdeu pelo caminho os seus conhecimentos, ao ponto de na Bretanha não conseguir mais do que erguer uns menires e uns dólmenes?


2 comentários:

Lucy disse...

Até estou sem fôlego!
Não te deram cartão de saúde mas de certeza te vão dar medalha de cidadã honorária e divulgadora máxima da Bretanha!

Helena Araújo disse...

hahahaha
Sem fôlego fico eu só de pensar em todos os posts que queria escrever sobre esta terra! :)