Partilho aqui dois comentários do leitor Jaime Santos, nos dois posts anteriores, porque me parece que devem ter mais visibilidade.
Em "regurgito ergo sum":
Discordo de si numa coisa. Infelizmente, acho que há mesmo quem diga
certas ignomínias depois de ter pensado bem nelas. Talvez não os
estudantes de Coimbra, que julgo que pensam que estão a ser irreverentes
e que provavelmente não sabem bem do que falam, mas há quem esteja para
além da decência.
Trump pode ser um alarve, mas o que diz não
se reduz à mera alarvidade. Tem um objetivo político claro, desde logo
ofender gratuitamente os opositores e entusiasmar os apoiantes, que
parece que não se lembram que tais atitudes vão contra aquilo que
poderíamos esperar de pessoas piedosas (como muitos deles declaram que
supostamente são).
Um certo sentido cristão das coisas leva-nos a
pensar que não devemos desesperar de ninguém, mas não sei se isso é
sempre verdade.
E se me disserem que isso representa um
julgamento moral não apenas de Trump mas de quem o apoia precisamente
porque ele age como age, pois paciência. A palavra deplorável pode não
chegar neste caso... O povo, ou parte dele, pelo menos, muitas vezes não
se recomenda (veja-se o que sucedeu na Alemanha de 1933 a 1945).
A
liberdade de expressão não é absoluta, mas em princípio a sua limitação
não seria necessária se fossemos capazes de perceber que a auto-censura
é por vezes uma componente fundamental daquilo a que chamamos
simplesmente boa educação e respeito pelos outros...
Em "quanto custa uma palavra":
[...] no seu
significado original, 'holocausto' queria dizer o consumo completo pelo
fogo (da dádiva sacrificial a Deus). Logo, nesse sentido, essa palavra
nunca poderia ter sido usado pelos estudantes (suspeito aliás que nem
sabem o que significa).
E é talvez devido a esse significado que
no contexto do genocídio perpetrado pelos nazis, os Judeus preferem o
uso da palavra catástrofe.
Por isso, volto ao meu comentário
anterior. Com os néscios, posso eu bem. O meu problema é com aqueles que
dizem as coisas não por ignorância ou descuido mas com absoluta
volição.
Talvez RAP tenha afinal razão de uma forma perversa.
Mais do que expor quem é parvo, a liberdade de expressão permite afinal
descobrir quem tem a alma negra. Não fora o que tal produz por arrasto
(a contaminação das mentes alheias), eu teria que dar a mão à palmatória
ao melhor humorista português da atualidade...
1 comentário:
Agradeço a relevância que atribuiu às minhas palavras.
Enquanto estávamos envolvidos nesta discussão, veio a lume a polémica com a caricatura de António, que foi publicada no Expresso e depois no NYT. Nela, o PM israelita é retratado como um perdigueiro com a estrela de David ao pescoço a guiar um Trump cego, de óculos escuros e quipá.
Foi considerada anti-semita, embora o insuspeito Haaretz tenha dito que não era, já que, segundo o jornal israelita, se Netanyahu usasse um símbolo ao pescoço, seria certamente esse (tratava-se afinal da estrela azul da bandeira, não de uma estrela amarela).
Eu tenho igualmente que considerar tal caricatura como anti-semita, como considerei a caricatura de Serena Williams racista. E isso pelo facto de que ambas, embora per si não me pareçam particularmente ofensivas (uma caricatura é afinal uma sátira e saber suportar tais exageros faz parte dos ossos do ofício de se ser uma figura pública), invocam fantasmas que deveriam estar enterrados.
Ou seja, o contexto importa e de que maneira. Como no nosso caso, e salvaguardadas as devidas distâncias...
Aliás, voltando àquilo que disse no seu post original, a degradação da linguagem pública não começou com Trump. A utilização de discurso profano no registo humorístico pode facilitar o riso, mas suspeito que acabou por contribuir para a vulgarização da linguagem que fez as delícias de Trump.
O Stephen Colbert era particularmente brilhante no seu registo de comentador conservador também porque nunca recorria aos palavrões...
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