03 maio 2019

a maldade banal

Partilho um comentário do Lutz Brückelmann sobre o caso do carro dos estudantes de História na Queima das Fitas de Coimbra (o sublinhado é meu):

"Só me ocorre uma explicação de como isso foi possível. Estudantes dizer esta barbaridade. Não sabem o que foi o Holocausto. É difícil de acreditar, e muito mau. Um estudante universitário num país livre com livre acesso à informação, não sabe o que foi
o Holocausto? Não houve escolas, sociedade civil, comunicação social? Não há um mínimo de conhecimento que é examinado antes de aceder a uma habilitação de frequentar o ensino superior?
Mas não é verdade. Verdade é que sabem o que foi o Holocausto. Pelo menos a palavra conheciam. E podemos deduzir que sabiam que foi algo muito grave, muito forte, algo "brutal". De outra forma não podiam ter chegado a usar a palavra como uma espécie de super-superlativo.
E o que podemos pensar perante isto?!
Que sabiam o que foi, mas não sabiam o que foi. Ou seja, cognitivamente sabiam, mas emocionalmente não. Nunca se confrontaram com o sofrimento abismal, a maldade insuperável que esta palavra descreve. São zombies. Emocionalmente amputados. Incapazes de empatia. De outra forma não é explicável que, mesmo depois de chamados à pedra, insistem na sua liberdade de matar "vacas sagradas".
Tiveram sorte de não terem sido eles a terem cometidos os crimes dos carrascos de Auschwitz. Mas partilham com eles a qualidade essencial que capacitou estes para cometer os crimes. A maldade banal. Porque não é preciso um empenhamento especialmente grande para ser-se agente do mal, do mal absoluto. Basta ser-se militantemente insensível."


E acrescento esta história que um amigo alemão me contou há vinte anos:

- Na escola recebi imensa informação sobre o Holocausto, de tal modo que pensava que sabia tudo. Depois de acabar o curso de medicina, nos anos oitenta, trabalhei alguns anos em Chicago, n
um hospital que tinha sido anteriormente psiquiátrico, e por isso tinha ainda grades nas janelas. Um dia vi um homem, que acabara de ser internado, a fugir do hospital soltando gritos lancinantes. Era um judeu sobrevivente dos campos de concentração, e ao ser metido num quarto com grades teve uma crise nervosa. Aqueles gritos horrorosos revelaram-me o que ainda não sabia sobre o Holocausto. 
Até então, tinha tido muita informação - mas na realidade ainda não entendera nada. 





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