02 julho 2018

sardinhada (1)



Amanhã conto com mais calma a bela sardinhada que juntou ontem centenas de portugueses num parque de Berlim. Hoje só dá mesmo para contar que, por causa da minha família, que levou o carro para um festival, eu fui de transportes públicos para o parque, e tive de me desenrascar como pude para levar a minha tralha toda (a carne, as mantas, os muitos etc. e ainda um cartaz para informar que a carne era de animais criados sem tortura).

O carrinho das compras cheio a transbordar, mais o saco IKEA em cima, mais o cartaz debaixo do braço, a entrar no comboio, a sair, a puxar penosamente toda aquela carga até ao eléctrico, a entrar e a sair do eléctrico, a entrar e a sair do autocarro, a puxar penosamente toda aquela carga pelo parque...
Em suma: atravessei mais de metade de Berlim a fazer figura de sem-abrigo.

(E ainda houve aquele momento extremamente embaraçoso ao sair do autocarro, quando as rodas do carrinho ficaram presas entre o autocarro e o passeio. Um dos passageiros saltou logo para me ajudar, mas as rodas estavam mesmo encravadas. O condutor fez cara de poucos amigos mas lá carregou num botão, o autocarro subiu ligeiramente, o carrinho libertou-se, e eu pude continuar o meu penoso percurso.)

(O passageiro que me veio ajudar tinha a pele um pouco mais escura que a minha. Podia ser alemão, podia ser turco, podia ser norte-africano, podia ser refugiado sírio ou iraquiano. Não sei. Sei apenas que estava atento, viu a minha aflição, e veio imediatamente ajudar. Nestes tristes tempos que correm, em que tão facilmente se dizem enormidades contra quem tem uma pele ligeiramente mais morena, acabo a reparar em pormenores destes como se tivessem importância. Tristes tempos, mesmo.)


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