Passei por uma conversa no facebook sobre as perguntas que as crianças pequeninas fazem, e como lhes responder. "O que é branqueamento de capitais?" e "o que é prostituição?", por exemplo. Lembrei-me do tempo em que era eu a destinatária de perguntas dessas.
A Christina, aos três anos:
- Mãe, o que é que estas senhoras estão a fazer paradas na rua a esta hora da noite?
- Estão à espera que um senhor as leve no seu carro.
(Para que conste: não menti!)
Aos sete anos, na zona portuária de San Francisco:
- Mãe, esta loja que diz "Kisses", o que é que vende?
-
Isso mesmo: beijos. É um sítio onde se paga para nos darem beijos. Vê
lá tu! Pessoas que não têm quem lhes dê os beijos de graça! Que
esquisito.
Matthias, aos cinco anos, quando - recém-chegada a Weimar - procurei o supermercado a meio da encosta e acabei em Buchenwald:
- O que é este lugar?
- É um sítio onde um governante muito mau que houve na Alemanha prendia todas as pessoas de quem não gostava. Podia ter-me acontecido a mim, por ter o cabelo castanho e não falar bem alemão. Ele decidia que as pessoas com uma determinada aparência não podiam viver normalmente na Alemanha, e só por causa disso prendia-as aqui.
- Se vivesses nesse tempo, o que é que terias feito?
- Não sei. Se fizesse alguma coisa contra eles, podiam prender-me e entregar-vos a uma família dos maus, para vos educarem como maus. E tu, o que terias feito se vivesses nesse tempo?
- Perguntava aos maus: "porque é que vocês estão a fazer isto?"
Suspeito que a Hannah Arendt ia gostar deste alemãozinho.
Quando eu era criança e fazia perguntas incómodas, os adultos respondiam-me que eu era demasiado pequena para entender. Ainda tentei argumentar: "tenta responder-me, e logo se vê se eu entendo ou não". Mas eles calavam-se, deixando-me frustrada e revoltada.
Tenho a certeza que as crianças nunca são demasiado pequenas para entender.
Pelo contrário: muitas vezes entendem melhor que os adultos. A resposta do miúdo de cinco anos em frente a Buchenwald foi uma grande lição para a mulher de quase quarenta anos que eu era.
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